O exercício profissional da advocacia, para quem tem vocação e curte o que faz, revela-se muito gratificante! Todavia, ao lado desta satisfação, o advogado, mais do que no passado, tem enfrentado uma série de dificuldades, que vão desde a sua relação com o cliente até a incompreensão de alguns magistrados que lhe impõem obstáculos absolutamente desnecessários.
O ajuizamento, pelo advogado, da ação de execução, de cobrança ou de arbitramento sujeita-se às regras ordinárias de recolhimento de custas judiciais, que deve ser comprovado desde logo, ao ensejo da distribuição da demanda.
E isso, mesmo sendo reconhecido por lei que os honorários advocatícios têm natureza alimentar (artigo 85, parágrafo 14, do Código de Processo Civil) e, ainda, que a advocacia é essencial à administração da Justiça!
Reconhecida a legitimidade (artigo 23 da Lei nº 8.906/94) de o advogado interpor recurso próprio contra o capítulo autônomo da sentença que fixou a verba honorária, o recorrente, por força do artigo 4º, inciso II, parágrafo 2º, da Lei nº 11.608/2003, que dispõe sobre as custas judiciais no Estado de São Paulo, deverá recolher 4% do valor da condenação a título de preparo da apelação.
Assim, por exemplo, independentemente do valor da causa, se a sentença condenou a parte derrotada a pagar honorários advocatícios no valor de R$ 10 mil, o preparo da apelação, interposta pelo advogado, visando à majoração de tal quantia, será de R$ 400. Simples assim!
Não obstante, como geralmente o advogado recorrente argumenta, na razões de apelação, que a fixação da verba honorária pela sentença impugnada ficou muito aquém da regra do artigo 85, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil, uma corrente pretoriana minoritária do Tribunal de Justiça bandeirante, confundindo — involuntariamente, por certo — o pedido de majoração dos honorários como se fosse um pleito deduzido numa petição inicial e, assim, tem determinado a complementação do preparo, a ser recolhido sobre o valor da causa. Desse modo, se a demanda ostentar um valor de R$ 5 milhões de reais, o advogado terá de recolher R$ 92 mil, que é o teto previsto na referida lei de custas, quando na verdade a condenação fora, como acima visto, de R$ 10 mil. É, com efeito, para dizer o mínimo, verdadeiro obstáculo, praticamente intransponível, que se oferece ao causídico!
Em outra situação, ainda mais grave, mas que igualmente constitui para o advogado efetiva postergação da garantia de acesso à Justiça, refere-se à ação de arbitramento de honorários.
É ressabido que nessa espécie de demanda o valor atribuído à causa é meramente estimativo, precisamente porque o advogado autor visa ao acertamento de uma quantia reputada adequada pelo serviço que então prestou ao ex-cliente demandado.
Pois bem, fixado por sentença um valor equidistante daquele que o autor entende justo, interpõe ele apelação, recolhendo o respectivo preparo no montante de 2% sobre o valor da condenação.
No entanto, a mesma tendência jurisprudencial supra referida, caracterizada por notória insensibilidade, determina a complementação do preparo à luz do valor da causa originária, na qual o advogado demandante prestou o seu serviço profissional.
Nesse sentido, recentemente, na minha atividade profissional, o advogado meu cliente, diante de alteração ex officio do valor da causa (para R$ 55 milhões) pelo relator da apelação, que manifestava inconformismo pela fixação ultrajante de R$ 4.000 de honorários, teve de recolher R$ 92 mil pela distribuição da demanda + R$ 92 mil de preparo de apelação! Pode?!?
Isso significa, em bom português, que o advogado, que nada recebera pelo patrocínio exitoso de uma demanda cujo valor sobejava R$ 50 milhões, teve de arcar, além dos meus honorários, com quase R$ 200 mil, a título de custas, simplesmente porque o desembargador relator, a despeito de se tratar de ação de arbitramento, entendeu que o demandante visava a receber 20% sobre o valor da causa que patrocinara! E tal situação — por paradoxal que possa parecer — numa ação de arbitramento...
Ora — é até ocioso dizer —, se ele, autor, realmente pretendesse receber um valor certo e determinado, é intuitivo que a ação não seria de arbitramento, mas, sim, de cobrança do quantum debeatur.
E é exatamente esta a orientação que se consolidou no Superior Tribunal de Justiça, como, v. g., extrai-se de acórdão da 3ª Turma, no julgamento do Recurso Especial nº 633.514/SC, com voto condutor da ministra Nancy Andrighi, no qual foi traçada, com admirável precisão, a distinção entre a ação de cobrança de honorários e a ação de arbitramento, frisando-se que, na primeira, o valor cobrado já se encontra definido ao passo que, na segunda, o objetivo é "dar corpo ao crédito", textual:
"Disso decorre que a ação de arbitramento é inteiramente diversa de uma mera ação de cobrança. Nesta, o valor do crédito perseguido já se encontra definido, e basta ao juiz verificar a conformidade do pedido ao título que o embasa, mediante análise de provas relativas à constituição do crédito e à ausência de provas de sua quitação ou extinção. Uma ação de arbitramento, por outro lado, visa justamente a dar corpo a esse crédito, que é incerto no momento de sua propositura. Ela aproxima-se, portanto, no procedimento, a um processo de liquidação, inclusive com a possibilidade de tornar-se imprescindível a realização de perícia judicial".
Tenha-se presente que, em situação análoga, a 4ª Turma, por ocasião do julgamento do Agravo em Recurso Especial nº 652.954/SP, da relatoria do ministro Marco Buzzi, secundou o seguinte entendimento:
Em decorrência das considerações acima expostas — e certamente por outras distorções igualmente graves acerca dessa questão —, o deputado estadual Roberto Morais (Cidadania) acaba de subscrever o Projeto de lei nº 212/2022, em tramitação perante a Assembleia Legislativa paulista, que acrescenta o inciso IV no artigo 7º da já mencionada lei de custas, com a seguinte redação:
A justificar a oportuna proposta, o seu respectivo autor pondera que:
Saliente-se por fim que, longe desta proposta configurar alguma espécie de privilégio à classe dos advogados, não custa lembrar que é a própria Constituição Federal que lhe outorga um status social que, em relação à efetividade da Justiça, a diferencia de outras profissões, e, ainda, que a legislação em vigor reconhece expressamente o caráter alimentar dos honorários advocatícios.
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