A autonomia de vontade das partes é a pedra fundamental da arbitragem, e dentro disso se insere o direito de as partes acordarem pela confidencialidade do processo arbitral. Mas hoje existe um grande interesse do mercado para que seja dada maior transparência ao processo.
Dessa forma, a advogada Adriana Braghetta, especializada em litígios nacionais e internacionais, abriu a discussão do painel "Confidencialidade, transparência e segredo de justiça" no 20º Congresso Internacional de Arbitragem, promovido pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem.
A advogada ressaltou a relevância do tema para destrinchar qual a medida ideal entre a confidencialidade e a transparência. Primeiramente, falou sobre uma pesquisa feita recentemente que concluiu que a confidencialidade ainda é uma das principais razões para a escolha do procedimento arbitral, segundo 38% dos entrevistados. O número é mais significativo entre o grupo de advogados internos: 58% disseram que a confidencialidade está entre os três principais elementos para escolha pela arbitragem.
Assim, na visão de Braghetta, a arbitragem é um fenômeno externo, no qual aqueles que querem resolver conflitos envolvendo direitos patrimoniais disponíveis podem fazer isso em um ambiente privado, onde criam suas regras. E a confidencialidade é uma regra importante.
Para a advogada, existindo o interesse legítimo à confidencialidade, ela deve ser aplicada, pois a própria Constituição estabeleceu exceções à publicidade dos julgamentos: a defesa da intimidade ou o interesse social. Nesse sentido, a segurança jurídica que resulta do cumprimento do acordado entre as partes se revela, exatamente, como cumprimento do interesse social, sustentou.
A especialista lembrou também que a arbitragem é um sistema mundial, não local. Logo, o olhar deve ser internacional, mesmo à luz da Constituição, pois a arbitragem só tem sentido se tiver valor internacionalmente.
Por outro lado, diz concordar com a importância da transparência, e que são poucos os casos que realmente é necessária a confidencialidade; então se não houve regulação entre as partes, a arbitragem deve ser pública.
Adriana citou, como exemplo recente da discussão, uma resolução da Comissão de Valores Mobiliários que propôs a criação de um novo comunicado para que companhias abertas divulguem informações sobre demandas judiciais e arbitrais ligadas a questões societárias. Ela afirmou que a resolução da CVM é adequada porque uma coisa é arbitragem comercial, outra são os litígios difusos. Mas destacou que fica a dúvida sobre o que deve ser revelado.
José Rogério Cruz e Tucci, advogado e professor titular da Faculdade de Direito da USP, se manifestou no sentido de que a transparência dos procedimentos arbitrais se coaduna com o devido processo legal, mas não há uma regra em nosso sistema que disponha que o julgamento e a discussão tenha que ser pública.
O artigo 93, IX da CF, comina de nulidade se for inobservada a regra da ampla publicidade e da fundamentação dos atos decisórios, inclusive os arbitrais. Mas, de acordo com Tucci, o comando constitucional quer dizer que a sentença deve ser publicizada em cartórios ou nas câmaras, não que precisa de exposição da causa perante o público, ou seja, de publicidade ativa.
O advogado, que também é colunista da ConJur, disse que a questão está polarizada e demanda ponderação. Com a alteração da Lei de Arbitragem, a administração pública passou a poder solucionar litígios por meio do sistema arbitral. "E se tornou relativo falar que confidencialidade é um dos pilares da arbitragem, uma vez que é da essência da administração a transparência", pontuou.
Para Tucci, embora a arbitragem possa ser catalogada como universal, o método sempre depende da cultura. Assim, a forma com que ocorre a confidencialidade na Inglaterra não deve ser idêntica à aplicada no Brasil ou no Canadá, por exemplo.
Citando um caso em que as partes tenham acordado por escrito, mas que não haja nenhum interesso social na confidencialidade, o especialista não entende como correto aplicá-la como regra. Outro fator que preocupa Tucci é o uso da confidencialidade pelas partes para fraudar credores. O interesse das partes não poderia se sobrepor à potencialidade de fraude contra credores.
Em sua opinião, o raciocínio do árbitro poderá ser o mesmo do juiz, avaliando caso a caso a necessidade de publicidade restrita, para definir qual processo precisa seguir a confidencialidade.
Por fim, Tucci ressaltou a enorme segurança do processo arbitral e o cuidado que os árbitros têm, mas diz acreditar que não pode haver radicalização. É preciso tomar cuidados para aperfeiçoar o sistema, e encontrar um meio termo.
Comentários
Postar um comentário