A decisão a seguir evidencia a diferença que existe entre o processo judicial e o processo arbitral. É um equívoco tomar um pelo outro. Boa leitura!

“RECURSO ESPECIAL. IMPUGNAÇÃO À EXECUÇÃO DE TÍTULO ARBITRAL.

VEICULAÇÃO DE PRETENSÃO DESTINADA A ANULAR A SENTENÇA ARBITRAL, COM BASE NAS MATÉRIAS VERTIDAS NO ART. 32 DA LEI DE ARBITRAGEM, APÓS O PRAZO NONAGESIMAL. IMPOSSIBILIDADE. DECADÊNCIA DO DIREITO.
RECONHECIMENTO. PRETENSÃO DE AFASTAR A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS EMPRESAS CONSORCIADAS, ESTABELECIDA NO TÍTULO ARBITRAL.
IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se em saber, em resumo: i) se o prazo decadencial de 90 (noventa) dias previsto no art. 33, § 1º, da Lei de Arbitragem aplica-se ou não à impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, para o propósito de suscitar as matérias vertidas no art. 32 da referida lei (hipóteses de nulidade da sentença arbitral); ii) se seria possível, em impugnação à execução da sentença arbitral que condenou as empresas consorciadas a pagar, indistintamente, o valor ali reconhecido, buscar a individualização das obrigações contraídas, segundo a participação de cada uma das executadas, sob a tese de que a solidariedade deve estar expressamente prevista no contrato.
2. Sob o signo da celeridade, da efetividade e da segurança jurídica especialmente perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral, a pretensão de anular a sentença arbitral deve ser intentada de imediato, sob pena de a questão decidida tornar-se imutável, porquanto não mais passível de anulação pelo Poder Judiciário, a obstar, inclusive, que o Juízo arbitral profira nova decisão sobre a matéria.
2.1 A Lei de Arbitragem, atenta a essa premência, estabelece, para tal desiderato, o manejo de ação anulatória (art. 33, caput) e, em havendo o ajuizamento de execução de sentença arbitral (art. 33, § 3º), de impugnação ao seu cumprimento, desde que observado, em ambos os casos, o prazo decadencial nonagesimal. Sem respaldo legal, e absolutamente em descompasso com a inerente celeridade do procedimento arbitral, supor que a parte sucumbente, única interessada em infirmar a validade da sentença arbitral, possa, apesar de não promover a ação anulatória no prazo de 90 (noventa) dias, manejar a mesma pretensão anulatória, agora em impugnação à execução ajuizada em momento posterior a esse lapso, sobretudo porque, a essa altura, o direito potestativo (de anular) já terá se esvaído pela decadência. Precedente específico desta Terceira Turma.
3. A pretensão postulada em juízo de especificar a responsabilidade individual de cada consorciada refoge do mérito decidido pelo Tribunal arbitral, que acabou por firmar a responsabilidade solidária das consorciadas, requeridas no procedimento arbitral.
3.1 A responsabilidade solidária das requeridas constou na sentença arbitral, seja em seu intróito, em que se reportou ao contrato de constituição do consórcio, no qual há expressa previsão de solidariedade entre as consorciadas; seja em sua parte dispositiva, sobre a qual recaem os efeitos da coisa julgada, em que há a condenação das requeridas, sem nenhuma especificação.
3.2 A pretendida especificação das obrigações assumidas por cada consorciada, somente deduzida perante o juízo estatal, haveria de ser arguida no âmbito da própria arbitragem, o que, pelo que se pode depreender dos autos, não foi levada a efeito, nem sequer por ocasião do pedido de esclarecimentos subsequente à sentença arbitral. Tal pretensão redunda na própria modificação do mérito da sentença arbitral (especificamente no conteúdo da obrigação reconhecida no título arbitral, objeto de execução), providência, é certo, que o Poder Judiciário não está autorizado a proceder.
3.3 Esta constatação - absolutamente autorizada pelo efeito devolutivo do recurso especial, na extensão e na profundidade da matéria trazida ao conhecimento desta Corte de Justiça - é suficiente para reconhecer a intangibilidade da sentença arbitral, o que esvazia o alegado malferimento do art. 278 da Lei n.
6.404/1976.
4. Recurso especial improvido.”
(REsp 1862147/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 20/09/2021)

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