Herança do cônjuge / companheiro no regime da separação obrigatória de bens, por Antonio Ivo Aidar

Logo no limiar da vigência do Código Civil de 2002, os operadores do Direito, mormente aqueles que militam exclusivamente na área do Direito de Família, passaram a questionar a constitucionalidade do artigo 1790, uma vez que ele contrariava a lição insculpida no § 3º do artigo 226 da Carta Magna, onde os companheiros foram equiparados aos cônjuges, reconhecidos como entidade familiar, assim como o § 6º do artigo 227 que fez terra arrasada da odiosa dicotomia entre filhos legítimos e ilegítimos, declarando que todos os filhos são iguais perante a lei.
Por força da decisão exarada pela terceira turma do STJ no julgamento do REsp 878, restou afastada a contradição elencada no citado artigo 1790, reconhecendo-se o direito de herança dos(as) companheiros(as), em igualdade de condições com os cônjuges. Neste diapasão fez-se letra morta do artigo retro mencionado, permanecendo ele como peça decorativa em nosso Estatuto Civil.
Naquilo que pertine o ultrapassado entendimento de que o(a) companheiro(a) em concorrência com filhos somente do falecido, herdaria metade daquilo que coubesse aqueles, a matéria também restou pacificado após julgamento do REsp 1638.123 do STJ, colocando-se uma pá de cal na insidiosa tese de que filhos devam receber cotas partes de herança desiguais.
Após este breve preambulo é preciso atacar de frente o contraditório e anacrónico texto ancorado no Inciso I do artigo 1829 do mesmo “Codex” já falado que assim preleciona:
 “Art. 1829 – A sucessão legitima defere-se na ordem seguinte:
I – Aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal de bens ou no da separação obrigatória de bens (Art. 1640, parágrafo único), ou se no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares”. (grifo nosso)
Examinando-se com um mínimo de acuidade o texto legal acima reproduzido, denota-se ter o legislador contemplado herançacônjuges e companheiros com direito de herança, mesmo que casados sob o manto da mais absoluta e total separação de bens.
E, nem se diga de direito de meação e sucessão são coisas distintas para sustentar tamanha incongruência e falta de sensibilidade do legislador.
Com efeito, no regime da separação convencional de bens são os nubentes que declaram expressamente a intenção de não mearem os bens passados, presentes e futuros. Por obvio, quando assim definem o regime de bens a presidir o casamento / união estável, os consortes não pretender que no futuro, um seja sucessor do outro. Descabe alguns incautos aduzirem que foi uma maneira de proteger o cônjuge / companheiro sobrevivente. Ora, uma pergunta não quer calar: Por que às pessoas casadas conviventes no regime da separação obrigatória de bens não foi estendida referido direito?
Sob qualquer ângulo que se analise a questão, descabe a diferenciação atrás anunciada.
Os cônjuges / companheiros que se uniram sob o manto da separação obrigatória de bens não tiveram a liberdade de escolher o regime de casamento, ao contrário daqueles que por exclusiva vontade manifestaram o objetivo de não partilharem seus bens.
Entendo que urge a alteração do texto legal que trata da sucessão, no regime da Separação Obrigatória de Bens. Com a palavra o Congresso Nacional.