Atual panorama do “acordo japonês” no Brasil, por Raphael Miziara

O acordo japonês é aquele por meio do qual se admite redução salarial em troca da permanência do emprego, evitando, assim, dispensas. Trata-se de medida de proteção ao emprego. Mas, é preciso compreender o contexto histórico, a origem de tal expressão e a razão pela qual ela é utilizada para designar esse tipo de avença. 
Os direitos de quarta dimensão estão ligados à democracia e ao pluralismo, principalmente no que tange aos direitos das minorias. Fala-se, então em pluralismo, democracia e o direito de ser diferente. Contudo, essa percepção apresenta um cidadão passivo, carente de proteção estatal, que a tudo espera como direito de contribuir; logo, o sujeito é membro da sociedade, podendo, quando quiser, participar das coisas do Estado.[1] 
Contudo, é preciso que também se vislumbrem os direitos de quarta dimensão sob perspectiva de dever, que enxerga e imprime ao cidadão a necessidade de um ser ativo e com responsabilidade pelos rumos da nação. Esta visão é a essência do bom cidadão.
 A partir dessa perspectiva ativa é que surge o chamado acordo japonês. A doutrina leciona que foi o alto senso de cooperação que levou o Japão, após a 2ª Guerra Mundial, a superar a grave crise financeira e social, inclusive adotando, no âmbito trabalhista, o chamado acordo japonês, que permite a redução salarial em troca da permanência do emprego de contingente maior, evitando, assim, a despedida em massa. Houve um sentimento patriótico, no qual ocorreu divisão de responsabilidades, não só imposta pelo Estado, mas procurada e aceita pelos próprios cidadãos.[2]
 Portanto, o acordo japonês é aquele por meio do qual se admite redução salarial em troca da permanência do emprego, evitando, assim, dispensas. Trata-se de medida de proteção ao emprego mas que, para ser legítima e obsrevadora da boa-fé, deve ser de caráter temporário, apenas e enquanto for necessária para recuperação da economia.
 No Brasil é garantida a irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo (art. 7º, VI, CRFB/88) e desde que seja respeitada a contrapartida adequada, qual seja, a garantia do emprego.
 Vale lembrar que nos termos do art. 611-A, § 3º, da CLT, incluído pela Lei nº 13.467, de 2017 – Reforma Trabalhista – “se for pactuada cláusula que reduza o salário ou a jornada, a convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho deverão prever a proteção dos empregados contra dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo”. 
A citada norma celetista deve ser lida em conjunto com as disposições da Lei nº 4.923/65, editada logo após os anos de 1961 a 1964, período no qual o Brasil sofreu um período de forte turbulência política, que agravou o descontrole econômico da inflação, entre outras variáveis macroeconômicas.[3]
 De acrodo com o art. 2º da Lei nº 4.923/65 “a empresa que, em face de conjuntura econômica, devidamente comprovada, se encontrar em condições que recomendem, transitoriamente, a redução da jornada normal ou do número de dias do trabalho, poderá fazê-lo, mediante prévio acordo com a entidade sindical representativa dos seus empregados, homologado pela Delegacia Regional do Trabalho, por prazo certo, não excedente de 3 (três) meses, prorrogável, nas mesmas condições, se ainda indispensável, e sempre de modo que a redução do salário mensal resultante não seja superior a 25% (vinte e cinco por cento) do salário contratual, respeitado o salário-mínimo regional e reduzidas proporcionalmente a remuneração e as gratificações de gerentes e diretores”.
Ainda, conform o parágrafo primeiro do mesmo dispositivo, “para o fim de deliberar sobre o acordo, a entidade sindical profissional convocará assembléia geral dos empregados diretamente interessados, sindicalizados ou não, que decidirão por maioria de votos, obedecidas as normas estatutárias”.
Igualmente, as empresas que tiverem autorização para redução de tempo de trabalho, nos termos do art. 2º e seus parágrafos, não poderão, até 6 (seis) meses depois da cessação desse regime admitir novos empregados, antes de readmitirem os que tenham sido dispensados pelos motivos que hajam justificado a citada redução ou comprovarem que não atenderam, no prazo de 8 (oito) dias, ao chamado para a readmissão (art. 3º, caput, da Lei nº 4.923/65).
E, firmado o acordo, é também vedado às empresas mencionadas no art. 3º, nas condições e prazos nele contidos, trabalhar em regime de horas extraordinárias, ressalvadas estritamente as hipóteses previstas no art. 61, e seus parágrafos 1º e 2º, da CLT (art. 4º, caput, da Lei nº 4.923/65). 
Portanto, no Brasil, como bem sintetizam José Wally Gonzaga Neto e Adriana Schio, são os requisitos para o “acordo japonês”: (i) negociação coletiva; (ii) respeito ao salário mínimo; (iii) limite de 25% na redução salarial; (iv) obrigatoriedade de extensão da redução salarial proporcionalmente aos cargos de direção e gerência; (v) duração de três meses, com possibilidade de prorrogação; (vi) vedação à realização de horas extras; (vii) vedação à admissão de novos empregados pelo prazo de seis meses após o término da redução salarial, entre outros.[4] 
A esse rol, ainda podese acrescentar um oitavo requisito, previsto no art. 611-A, § 3º, da CLT, incluído pela Reforma Trabalhista, qual seja, (viii) proteção dos empregados contra dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo. 
Também com a ideia redução salarial e de jornada com proteção do emprego foi criado o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), instituído pela Medida Provisória nº 680, de 6 de julho de 2015, posteriormente convertida na Lei nº 13.189, de 19 de novembro de 2015 e, também posteriormente, alterada pela Lei nº 13.456, de 2017, que alterou o nome do programa para “Programa Seguro-Emprego (PSE)”, tudo no afã de conter o crescimento do desemprego involuntário gerado a partir da crise econômica de 2015. 
O Programa Seguro-Emprego (PSE) foi criado com os seguintes objetivos: possibilitar a preservação dos empregos em momentos de retração da atividade econômica; favorecer a recuperação econômico-financeira das empresas;  sustentar a demanda agregada durante momentos de adversidade, para facilitar a recuperação da economia; estimular a produtividade do trabalho por meio do aumento da duração do vínculo empregatício; e fomentar a negociação coletiva e aperfeiçoar as relações de emprego e consiste em ação para auxiliar os trabalhadores na preservação do emprego (art. 1º, capute parágrafo único, da Lei nº 13.189, de 19 de novembro de 2015) 
Podem aderir ao PSE as empresas de todos os setores em situação de dificuldade econômico-financeira que celebrarem acordo coletivo de trabalho específico de redução de jornada e de salário. 
A adesão ao PSE podia ser feita perante o Ministério do Trabalho até o dia 31 de dezembro de 2017, prazo esse já expirado. Assim, na presente data, não mais existe a possibilidade de adesão ao PSE, sendo que o acordo japonês no Brasil permenece regulado apenas pelas disposições normativas do art. 611-A, § 3º, da CLT c/c Lei nº 4.923/65.
 [1]LIMA, Francisco Gérson Marques de. Dos deveres constitucionais: o cidadão responsável. Disponível em: Acesso em: 22.07.1982.
[2]LIMA, Francisco Gérson Marques de. Dos deveres constitucionais: o cidadão responsável. Disponível em: Acesso em: 22.07.1982.
[3]MESQUITA, Mário M. C. Brasil 1961-1964: inflação, estagnação e ruptura. nº 569. Departamento de Economia da PUC-RJ. Disponível em , acesso eme 28 de julho de 2018.
[4]GONZAGA NETO, José Wally; SCHIO, Adriana Cavalcante de Souza. A negociação coletiva para redução salarial: o”Acordo japonês” e o PPE. In: Revista eletrônica Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Curitiba. v. 5, n. 51, p. 146-155, jun. 2016.


Comentários