Turma do STJ rejeita limite de 30% para débito em conta. Decisão abre divergência ente 3ª e 4ª Turmas, por Mariana Muniz

Por três votos a dois, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (29/8) que não é válido o limite de 30% imposto aos bancos para débito na conta corrente de clientes que tomaram empréstimos e passaram a pagar as parcelas com descontos automáticos em contratos de crédito rotativos.
O colegiado bateu o martelo após voto-vista do ministro Antônio Carlos Ferreira, que desempatou o placar. Ferreira acolheu a tese do relator do Recurso Especial 1.586.910, ministro Luís Felipe Salomão, segundo a qual a restrição de 30% prevista na Lei 10.820/2003 só se aplica às hipóteses de crédito consignado. E que, portanto, o limite deveria ser derrubado.
Além de Ferreira, o relator foi seguido pela ministra Maria Isabel Gallotti. Votaram pela manutenção do teto os ministros Marco Buzzi e Raul Araújo.
A situação concreta analisada pelos ministros é a de um homem que firmou contrato de crédito pessoal no valor de R$ 115 mil com o Banco do Brasil, a serem pagos em 85 parcelas de R$ 2.543. O cliente alegava que o débito mensal em sua conta corrente representa quase 50% de seus vencimentos – e pedia a limitação dos descontos do empréstimo que contratou. Não se tratava de desconto em folha, mas de dinheiro mantido na conta-corrente.
“Não parece razoável e isonômico, a par de não ter nenhum supedâneo legal, aplicar a limitação legal prevista para empréstimo consignado a desconto de empréstimos em folha de pagamento, de maneira arbitrária, a contrato específico de mútuo livremente pactuado”, defendeu Salomão.
No voto proferido nesta terça, Ferreira reforçou que o empréstimo pessoal no qual foi autorizado apenas o débito na conta bancária do cliente é diferente do crédito consignado. Isso porque, segundo explicou, no crédito consignado o devedor não tem qualquer mecanismo para evitar a dedução da parcela.
“Nessa modalidade [crédito consignado], se o devedor se deparar com uma adversidade, não terá acesos aos recursos, não poderá optar por deixar de honrar com as obrigações. Não se está aqui incentivando o descumprimento contratual, mas sabemos que há situações em que essa possibilidade tem que ser considerada. Por isso a restrição legal de 30% da Lei 10.820 somente se justifica na hipótese de crédito consignado”, afirmou.
Divergências
Para Salomão, “em que pese haja precedentes com o entendimento de que a limitação é adotada como medida para solucionar o superendividamento, a bem da verdade opera no sentido oposto, tendo o condão de eternizar a obrigação, visto que leva à denominada amortização negativa do débito, resultando em aumento mês-a- mês do saldo devedor”.
O ministro se referia ao precedente da 3ª Turma do tribunal, que considerou válida a analogia feita com a Lei 10.820 para estender a limitação legal referente a empréstimos em folha a outras relações contratuais. O relator do REsp 1.584.501, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, entendeu que o limite está de acordo com o princípio da dignidade humana.
“Com efeito, se o desconto consumir parte excessiva dos vencimentos do consumidor, colocará em risco a sua subsistência e de sua família, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana”, afirmou Sanseverino.
Com essa divergência entre as turmas, os dez ministros da seção de direito privado poderão se reunir para uniformizar a orientação para bancos e correntistas.

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