Exibição de documento ou coisa, por Elpídio Donizetti

Pode o juiz ordenar que a parte, ou mesmo o terceiro, exiba documento ou coisa que se ache em seu poder (art. 396, CPC/2015). Tal poder decorre do dispositivo segundo o qual “ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade” (art. 378, CPC/2015).
A exibição de documento ou coisa pode ser formulada por uma das partes contra a outra, bem como determinada de ofício pelo juiz, caso este entenda necessário.
Qualquer que seja a forma, a finalidade da exibição é constituir prova a favor de uma das partes. Pode ser prova direta, quando se trata, por exemplo, da exibição de um contrato; ou prova indireta, quando, por exemplo, se requer a exibição de um veículo acidentado para submetê-lo à perícia.
Tratando-se de pedido de exibição formulado por uma das partes, este é feito por petição (pode ser na inicial, na contestação ou mesmo em caráter incidental na fase probatória), com os requisitos do art. 397, CPC/2015. Deferida a exibição, procede-se à intimação da parte contrária, que pode adotar três atitudes distintas: fazer a exibição, permanecer inerte ou responder negando a existência do documento ou da coisa ou o dever de fazer a exibição. Feita a exibição, o procedimento encerra-se. Permanecendo inerte ou negando a existência do documento ou da coisa ou negando o dever de apresentá-lo, o juiz decidirá o pedido, depois de permitir ao requerente provar que as alegações do requerido não correspondem à verdade (art. 398, CPC/2015).
Julgando procedente o pedido de exibição, o juiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar (art. 400, CPC/2015). Trata-se de decisão interlocutória, que desafia agravo de instrumento (art. 1.015, VI, CPC/2015).
A novidade trazida pelo CPC/2015 fica por conta das medidas que podem ser adotadas pelo juiz para “forçar” a exibição. Nos termos do art. 400, parágrafo único, “sendo necessário, o juiz pode adotar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para que o documento seja exibido”.
O parágrafo único do art. 400 supera, portanto, o entendimento constante na Súmula 372 do STJ, segundo o qual, “na ação de exibição de documentos, não cabe aplicação de multa cominatória”. Em verdade, essa súmula já vinha sendo relativizada pelo próprio STJ que, na vigência do CPC/1973, admitiu a fixação de astreintes na hipótese de direitos indisponíveis. Nesse sentido:
“[…] Tratando-se de pedido deduzido contra a parte adversa – não contra terceiro –, descabe multa cominatória na exibição, incidental ou autônoma, de documento relativo a direito disponível. No curso de uma ação que tenha objeto próprio, distinto da exibição de documentos, a consequência da recusa em exibi-los é a presunção de veracidade, por disposição expressa do art. 359 do CPC. Sendo assim, a orientação da jurisprudência do STJ é no sentido do descabimento de astreintes na exibição incidental de documentos. No entanto, a presunção é relativa, podendo o juiz decidir de forma diversa da pretendida pelo interessado na exibição com base em outros elementos de prova constantes dos autos. Nesse caso, no exercício dos seus poderes instrutórios, pode o juiz até mesmo determinar a busca e apreensão do documento, se entender necessário para a formação do seu convencimento. Já na hipótese de direitos indisponíveis, a presunção de veracidade é incabível, conforme os arts. 319 e 320 do CPC, restando ao juiz somente a busca e apreensão. Cumpre ressalvar que, nos casos que envolvem direitos indisponíveis, por revelar-se, na prática, ser a busca e apreensão uma medida de diminuta eficácia, tem-se admitido a cominação de astreintes para evitar o sacrifício do direito da parte interessada. […]” (STJ, REsp 1.333.988-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 09.04.2014).
No que diz respeito ao pedido de exibição, a primeira providência é de natureza pura e simplesmente mandamental, consistente na determinação do juiz para que a parte exiba o documento ou coisa. Descumprido o mandamento (ordem), podem-se reputar verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar. Como nem sempre a aplicação da presunção de veracidade dos fatos é viável, o CPC/2015 confere ao juiz poder para agregar um plus à tutela mandamental. Aí é que entram as medidas a que se refere o parágrafo único.
Se a exibição é requerida contra quem não é parte no processo, o procedimento e as consequências são totalmente distintas. Nesse caso, deferida a exibição, o terceiro é citado para responder no prazo de quinze dias (art. 401, CPC/2015).
Com a citação, a par da relação processual entre autor e réu, estabelece-se “uma relação processual paralela, com partes diferentes, tendo também por objeto uma lide diferente, girando em torno da existência do documento ou coisa procurada e do dever de exibir”[1].
Se o terceiro faz a exibição, encerra-se o procedimento. Se o terceiro silencia, o juiz profere sentença, na qual, se julgar procedente o pedido, ordena o depósito do documento ou coisa em cinco dias (art. 403, CPC/2015). Se o terceiro contesta, negando a obrigação de exibir ou a posse do documento ou da coisa, procede-se à instrução do incidente (art. 402, CPC/2015) e, em seguida, profere-se a decisão.
Se o terceiro descumpre a ordem para depositar, o juiz determina a busca e apreensão, requisitando, se necessário, força policial, sem prejuízo da remessa de peças dos autos ao Ministério Público, para promover ação penal por crime de desobediência (art. 330 do CP), se for o caso (art. 403, parágrafo único). Frise-se que o CPC/2015 ainda permite que contra o terceiro sejam fixadas multa ou outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar a efetivação da decisão.
O art. 404, CPC/2015, elenca, de forma exemplificativa, as hipóteses em que o terceiro pode se escusar de exibir o documento ou a coisa. Será legítima a recusa ou a defesa fundada na alegação de que o documento ou coisa são concernentes a negócios da própria vida da família; se a sua apresentação ou publicidade puder violar dever de honra ou desonra à parte ou ao terceiro, bem como a seus parentes consanguíneos ou afins até o terceiro grau, ou lhes representar perigo de ação penal; se a exibição acarretar a divulgação de fatos, a cujo respeito, por estado ou profissão, devam guardar segredo; se subsistirem outros motivos graves que, segundo o prudente arbítrio do juiz, justifiquem a recusa da exibição; ou, por fim, se houver disposição legal que justifique a recusa da exibição (exemplo: art. 206 da Lei nº 9.279/1996[2]). Ressalve-se que as escusas não são absolutas. Assim, deve o juiz levar em conta “os motivos apresentados pelo requerido em confronto com a importância da prova no contexto do litígio e com a própria natureza e objeto da discussão travada nesse processo; em alguns casos, assim, ainda se reconhecida a relevância da justificativa, poderá ser o alcance da escusa relativizado”.[3]

[1] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de Processo Civil anotado. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense. p. 474.
[2]  Lei nº 9.279/1996, “Art. 206. Na hipótese de serem reveladas, em juízo, para a defesa dos interesses de qualquer das partes, informações que se caracterizem como confidenciais, sejam segredo de indústria ou de comércio, deverá o juiz determinar que o processo prossiga em segredo de justiça, vedado o uso de tais informações também à outra parte para outras finalidades”.
[3] TABOSA, Fábio. Código de Processo Civil interpretado. Coord. Antônio Carlos Marcato. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 1.152.

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