Afinal: o agravo de instrumento interposto contra a decisão parcial de mérito do artigo 356 do novo CPC deve ser admitido com o efeito suspensivo automático do artigo 1.012 do novo CPC? Por Rogerio Mollica e Elias Marques de Medeiros Neto
O Centro de Estudos Avançados de Processo (CEAPRO)1
possui enunciado com a seguinte previsão: "O efeito suspensivo
automático do art. 1.012, aplica-se ao agravo de instrumento interposto
contra a decisão parcial do mérito". (art. 356)
A razão do
enunciado se baseia na premissa de que a natureza da decisão
interlocutória parcial de mérito se mostra similar ao da sentença final
de mérito, sendo certo que o NCPC não poderia tratar de forma desigual
os efeitos dos respectivos recursos a serem interpostos contra esses
referidos pronunciamentos judiciais.
A decisão
interlocutória parcial de mérito, nos termos do artigo 356 do NCPC, tem a
natureza de uma verdadeira sentença, não se diferenciando, em essência,
do pronunciamento judicial de que trata o artigo 487 do NCPC.
Teresa Arruda Alvim2
bem observa que: "O NCPC, em seu art. 356, admite de forma expressa a
possibilidade de julgamento parcial do mérito, rompendo o dogma da
sentença una. Chama a decisão, neste caso, de decisão interlocutória de
mérito. (...). Embora a decisão que julga antecipadamente parte do
mérito tenha conteúdo de sentença (art. 487, I), o recurso dela cabível é
o agravo de instrumento, para permitir que o processo prossiga em
primeiro grau, em relação aos pedidos ou a parte do pedido não
julgados".
Cassio Scarpinella Bueno3bem
lembra que "não sendo o caso de extinção total ou parcial do processo,
nem de julgamento antecipado total do mérito, cabe ao magistrado
verificar se o caso concreto amolda-se no que o CPC de 2015 passou a
identificar como julgamento antecipado parcial do mérito (art. 356).
Aqui também, o que o magistrado buscará, ainda que em parte, é o
proferimento de sentença nos moldes do inciso I do art. 487".
Neste contexto, o
legislador não poderia tratar de forma abruptamente diferente os
efeitos dos recursos que devem ser utilizados para provocar a revisão da
sentença e da decisão interlocutória de mérito, dada a mesma essência
existente nesses dois pronunciamentos judiciais.
Se a apelação,
interposta contra sentença, deve ser recebida com o duplo efeito, nos
termos do artigo 1012 do NCPC, razoável seria afirmar que o agravo de
instrumento, para a hipótese de ser interposto contra a decisão parcial
de mérito do artigo 356 do NCPC, também deveria ser recebido com o duplo
efeito; sendo admitido com efeito suspensivo automático.
Não se olvida,
aqui, que o legislador se preocupou muito com a efetividade, a
celeridade e a eficiência dos atos jurisdicionais, conforme bem se nota
da leitura dos artigos 4 e 8 do NCPC. Mas, por outro lado, a segurança
jurídica, o devido processo legal e a proporcionalidade são importantes
princípios que devem nortear a leitura constitucional do processo civil
(art. 1 do NCPC), de modo que se o legislador optou, em regra, conferir
efeito suspensivo automático ao recurso de apelação (artigo 1012 do
NCPC) interposto contra a sentença final de mérito, não parece coerente –
inclusive do ponto de vista de sistema – permitir que o agravo de
instrumento interposto contra a decisão parcial de mérito (artigo 356 do
NCPC) tenha o seu curso sem o efeito suspensivo automático do artigo
1012 do NCPC.
A incoerência se
agrava, ao se notar que o artigo 356 do NCPC prevê inclusive, em seu
paragrafo segundo, que a parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a
obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito,
independentemente de caução, ainda que haja recurso interposto.
Essa previsão
permite a absurda conclusão de que a decisão parcial de mérito seria, em
tese, mais forte, para fins de execução imediata, que uma sentença
final de mérito, proferida após a devida instrução probatória.
Este artigo não
necessariamente defende que o sistema processual ideal é aquele que
prevê que a sentença de mérito deva ser recorrida através de recurso de
apelação que tenha o efeito suspensivo automático.
Mas, defende sim,
com todas as letras, que se o legislador optou por conferir efeito
suspensivo automático para o recurso de apelação, não existe razão
cientifica para retirar a previsão de efeito suspensivo automático para o
agravo de instrumento a ser manejado contra a decisão parcial de mérito
do artigo 356 do NCPC, que nada mais representa do que uma verdadeira
sentença parcial antecipada de mérito.
E nessa linha, de
coerência sistêmica, as hipóteses excepcionais previstas no próprio
artigo 1012 do NCPC, nas quais a apelação deve ser recebida apenas com
efeito devolutivo, também se aplicariam, em tese, ao agravo de
instrumento interposto contra a decisão parcial de mérito do artigo 356
do NCPC.
Essa visão
estaria, no nosso humilde ver, em linha com uma leitura constitucional
do processo civil, bem proclamada pela professora Teresa Arruda Alvim4
como "linha mestra fundamental da construção do novo sistema processual
civil brasileiro. Um dos objetivos que se teve ao se elaborar este novo
código foi o de situá-lo, expressa e explicitamente, num contexto
normativo mais amplo, em que a constituição federal ocupa o principal
papel".
__________
2
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEICAO, Maria Lucia Lins. RIBEIRO,
Leonardo Ferres da Silva. MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros
Comentários ao Novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2016. p.
688.
3 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 331.
4
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEICAO, Maria Lucia Lins. RIBEIRO,
Leonardo Ferres da Silva. MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros
Comentários ao Novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2016. p.
60.
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