Brasil, custos de transação e insegurança jurídica (causas e consequências), por Rodrigo Dufloth

No Brasil, os custos de transação1 são elevadíssimos: há uma excessiva burocracia (causa), o que leva a uma ineficiência, que por sua vez é responsável por criar ambientes de incerteza (insegurança jurídica) quanto às relações do mercado, prejudicando sobremaneira o desenvolvimento econômico da nação2 (consequência).
Lembramos que, conforme a lição de Ronald H. Coase3, o Teorema de Coase reza, em síntese, que numa situação em que (I) as partes sejam racionais em relação ao seu interesse individual; (II) não haja custos de transação; e (III) haja um mercado para todas as mercadorias, envolvendo direitos de propriedade bem especificados, as transações de mercado levarão a uma alocação eficiente (maximizando o bem-estar total), independentemente da alocação inicial de direitos de propriedade.4 Ou, dito de outra forma, na ausência de custos de transação, não importa qual é a legislação, pois é sempre possível negociar sem custos a fim de adquirir, subdividir e combinar direitos sempre que isto aumentasse o valor da produção (versão positiva)5. Estamos, em nosso país, muito longes do Teorema de Coase.
Nosso país ocupa o 123º lugar (de um total de 190) no ranking do Doing Business 2017 (Facilidade de Fazer Negócios), divulgado pelo Banco Mundial6. Outro indicador interessante e recente é o Índice de Complexidade Financeira de 2017 da TMF Group7, que coloca o Brasil em 2º lugar no mundo dentre as jurisdições mais complexas em matéria de compliance das obrigações contábeis e fiscais. Em 1º lugar encontra-se a Turquia, seguida por (após o Brasil) Itália e Grécia; de outro lado — como países mais fáceis do mundo para contabilidade e tributos — estão Ilhas Cayman, Hong Kong, BVI e EAU (o que nos parece bastante intuitivo e condizente com a realidade dos ambientes de negócios). Soa como uma verdade acaciana que, no Brasil, a burocracia e ineficiência são reinantes8, causas9 do problema da insegurança jurídica, tendo como consequência graves empecilhos ao desenvolvimento econômico. Diante de tais dados, o que nos resta fazer?
De acordo com a versão normativa do Teorema de Coase, a legislação, ao encorajar acordos privados, poderia reduzir os custos de transação. O campo da Análise Econômica do Direito (ou Direito & Economia) ousa justamente estudar tais relações, com uma visão otimista (em oposição aos céticos) no tocante ao papel do Direito para o desenvolvimento econômico. Pressupondo que a racionalidade econômica precede a racionalidade jurídica10, e não o contrário, é de fato imprescindível o constante diálogo entre o Direito e a Economia, haja vista o papel (de incentivos positivos ou negativos) que aquele possui para esta11.
O jurista há que ser um engenheiro dos custos de transação, fomentando a segurança jurídica, na qual está inserida a noção de que os custos e riscos das transações podem ser calculados pelos agentes12 (ainda que dotados de racionalidade limitada), dando margem para os indivíduos envolvidos avaliarem quais os reais efeitos dos atos tomados em suas transações. Ela possibilita que os agentes se organizem na busca pelo resultado mais eficiente13. Nesse contexto, um sistema eficiente e previsível de contratos, de garantias e de direitos de propriedade bem definidos (caso de Hong Kong, por exemplo) é fundamental para a atividade empresarial. Um sistema de contratos e de garantias lento, burocrático e ineficiente (caso do Brasil, por exemplo) tende a aumentar os custos de transação das empresas, porque estas aumentam os custos de informação, de monitoramento e de barganha, criando incentivos (perversos) para a atividade econômica informal, para o descumprimento dos contratos, para a retenção de financiamentos e do investimento, dificultando a organização das "firmas" (sociedades empresariais)14.
Não é uma missão fácil, porém há de ser recompensadora. O próprio Ronald H. Coase ressalvou que as inter-relações entre o sistema econômico e o sistema jurídico são extremamente complexas, de modo que muitos dos efeitos das alterações na legislação sobre o funcionamento do sistema econômico (o próprio cerne da política econômica) ainda não se revelaram15. Felizmente, o prognóstico é positivo para a Análise Econômica do Direito, chegando até mesmo aos tribunais do Brasil16Alea jacta est!

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