Lançamento dos "Dispute Boards" no Brasil, por Antonio Luis Pereira de Sousa


A indústria da construção sempre buscou um método alternativo de solução de conflitos. Por outro lado, hoje, no Brasil, o Poder Judiciário está atarefado com 90 milhões de processos judi-ciais e, entre suas prioridades, não está solucionar disputas em contratos de construção, mas administrar a justiça. Desse modo, têm sido buscadas alternativas para solução de disputas con-tratuais, como a arbitragem ou a mediação. Nesse campo, está chegando ao Brasil uma nova ferramenta para solução de disputas – os Dispute Boards ("DBs") –, que será tema do 1º Seminário Internacional promovido pela Camara de Mediação e Arbitragem do Instituto de En-genharia, em parceria com AACE (Associação para o Desenvolvimento da Engenharia de Custos), CAMARB (Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil) e IBDiC (Instituto Brasileiro de Direito da Construção), nos dias 7 e 8 de Agosto deste ano, no Instituto de Engenharia. Mais informações no site iengenharia.org.br. 

O DB é o único ADR que tem por meta prevenir disputas na construção, o que é feito por um painel de três profissionais experientes da indústria da construção, especialistas naquele tipo de obra, que conheçam bem contratos de construção e interpretação de documentos contratuais, que dominem o idioma contratual. Esses profissionais devem estar habilitados a atuar com métodos consensuais de solução de conflitos , e na condução de seus deveres devem ser imparciais, independentes e sem conflitos de interesses, além de ter a confiança das partes. Os DBs se manifestam em tempo real, podendo emitir uma recomendação não-vinculante, ou uma decisão vinculante, e suas recomendações podem influenciar positivamente o gerenciamento do projeto. 

Os DBs estão previstos em contratos de construção como os padrões do FIDIC , que são uti-lizados pelo Banco Mundial e pelo Banco Inter-Americano de Desenvolvimento, na conformação dos editais de concorrências, e têm como meta não apenas solucionar disputas, mas preveni-las. Para que isso se torne factível, é necessário que seus membros sejam escolhidos concomi-tantemente com a adjudicação do contrato, para que o DB esteja instalado e em operação antes do início da construção e antes de qualquer conflito entre as partes. 

Os membros do DB, então, conhecem o contrato, o projeto e seu escopo, os planos, desenhos, as especificações jurídicas, técnicas e financeiras, o cronograma físico-financeiro, o caminho crítico, a sequência construtiva e as pessoas-chave do projeto. E é abastecido pelas partes com informações relevantes sobre o progresso da obra, relatórios gerenciais, atas de reunião, anotações no livro diário de obras, correspondências e outros documentos pertinentes e rele-vantes, os fatos e as circunstâncias relacionadas. 

Na primeira reunião é estabelecido o procedimento operacional, que deve ser simples para permitir que os membros do DB se concentrem no mérito da disputa. A partir daí, o DB passa a se reunir periodicamente no canteiro com a equipe do projeto, mesmo que não haja disputas, onde irão revisar o andamento das obras. 

Se o DB percebe algum problema potencial, irá encorajar as partes a negociar uma solução amigável, dentro do canteiro de obra, sem escalá-los à administração superior. Para tanto, pode se valer de um parecer (informal advisory opinion) ou de uma audiência. 

O parecer se materializa em reunião informal, onde cada parte apresenta seu posicionamento, seguindo-se uma reunião individual com cada parte (Cáucus). Encerrada a reunião, o DB se reúne apartado e delibera colegiadamente, apresentando às partes sua opinião falada ou escrita, sem que seja necessária uma audiência (e sem os custos que dela resultam). 

Em casos mais complexos, em que as partes estejam encontrando dificuldade em chegar à autocomposição, podem elas prontamente solicitar o agendamento de uma audiência, indicando qual o escopo da questão debatida, um dossiê comum de documentos e quem participará, para permitir que todos se preparem adequadamente. Na audiência, cada parte terá chance de explicar sua posição de modo justo e total e terá ampla oportunidade para esclarecer adequadamente as dúvidas do DB. 

Como os DBs se manifestam em tempo real, isso permite que o projeto se beneficie positi-vamente das recomendações e decisões, devendo o relatório conter uma avaliação dos fatos, indicação das disposições contratuais e legais relevantes relacionadas, e as razões que levaram o DB a recomendar a adoção dessa alternativa. 

A confiança das partes e a aceitação das manifestações do DB são frutos de capacitação dos integrantes, em sua especialidade técnica, experiência, do proveito prático que pode atrair para o projeto com suas recomendações e decisões e, antes de mais nada, da imparcialidade, inde-pendência e inexistência de conflitos de interesses, que permitam considerar a atuação do DB como sendo consistente. 

Os DBs têm a seu favor estatísticas de sucesso, uma vez que em 98,7% dos casos em que houve uma decisão deles, esta perdurou até o fim do projeto sem ser questionada por um pro-cedimento arbitral ou judicial posterior. Em 60% dos casos terminam sem nenhuma disputa. Os honorários e custos do DB se situam em um valor médio de 0,15% do custo final do projeto e são repartidos entre o dono da obra e o contratado principal, em partes iguais. 

Em conclusão, os DBs impedem que os contratos de construção saiam da rota original traçada pelas partes, mantendo-se o cronograma e o fluxo de caixa projetado, preservando o equilíbrio econômico-financeiro inicialmente existente, condição fundamental nas operações de project finance para atrair capitais privados, ao mesmo tempo em que impede que sobrecustos alterem o custo de oportunidade e de transação dos projetos. 

Assim, o DB mantém a segurança jurídica, dissipa riscos, estimula investimentos em infraes-trutura e custos mais competitivos, mantém desobstruída a comunicação, com assertividade, sem litígios que deteriorem os balanços e as relações empresariais.

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