Defensoria pode mover ação civil pública sobre patrimônio histórico, diz TJ-SP

A Defensoria Pública tem legitimidade para propor ações civis públicas que buscam proteger patrimônio de valor histórico, cultural, turístico e paisagístico, pois o tema envolve direito difuso de toda a população, inclusive pessoas hipossuficientes. Assim entendeu a 8ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo ao determinar que o juízo de primeiro grau analise pedido contra o asfaltamento de ruas em Presidente Venceslau (SP).

Segundo a ação, o planejamento do asfalto ignorou impactos na velocidade dos automóveis e na impermeabilidade do solo, além de deixar de lado a paisagem do município (calçamento da década de 1940). A
 sentença, no entanto, declarou o processo extinto sem análise de mérito.Quando a prefeitura começou a trocar os paralelepípedos no centro da cidade, em janeiro de 2016, o defensor público Orivaldo de Souza Ginel Junior alegou que as obras deveriam ser proibidas até que fossem organizadas audiências para os moradores debaterem a medida.
Para a juíza Daiane Oliva de Souza, da 2ª Vara de Presidente Venceslau, caberia apenas ao Ministério Público fiscalizar o patrimônio histórico e cultural. Reconhecer a legitimidade da Defensoria, segundo ela, “apartaria da sua essência e natureza que é justamente a tutela de interesses de necessitados”.
Embora o Supremo Tribunal Federal tenha declarado em 2015 que a Defensoria Pública pode propor ação civil pública (RE 733.433), a juíza afirmou que o caso analisado pela corte interessava à “população necessitada, pois dizia respeito a funcionamento de creches e escolas de educação infantil” em Belo Horizonte. Já a pavimentação asfáltica, conforme a decisão, é assunto alheio que nem sequer compromete a gestão democrática do município.
Discriminação
Ginel Junior recorreu ao TJ-SP, com apoio do Núcleo de Segunda Instância e Tribunais Superiores, alegando que pessoas necessitadas também são titulares do patrimônio histórico. A Procuradoria-Geral de Justiça assinou parecer contrário a esse argumento: declarou que só o MP poderia defender esse tipo de interesse, apesar de nenhum promotor ter visto problema no fim dos paralelepípedos.

Já o desembargador Manoel Ribeiro, relator do caso, afirmou que seguir essa tese “resultaria na inadmissível exclusão da população carente da titularidade do patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico,de forma manifestamente discriminatória”. O desembargador também afirmou que o conceito de necessitado não se restringe ao plano econômico, mas também a recursos culturais e sociais.
Segundo ele, o STF já declarou que a Defensoria não é obrigada a comprovar previamente a pobreza de seu público-alvo (ADI 3.943). O relator afirmou que a Lei das ACPs (Lei 7.347/1985) inclui a instituição na lista das legitimadas a proteger interesses difusos, assim como a Constituição Federal e a norma que organiza a Defensoria Pública no país (Lei Complementar 80/1994).
Ribeiro mandou os autos de volta à primeira instância, para garantir o julgamento do processo, e o voto foi seguido por unanimidade.
Precedente
A maioria das vias citadas na peça inicial já foi asfaltada enquanto o recurso tramitava, segundo informou a Secretaria Municipal de Planejamento à ConJur. Ainda assim, o Núcleo de Segunda Instância e Tribunais Superiores da Defensoria avalia que o acórdão da 8ª Câmara abre um precedente relevante para novas situações.

1000785-92.2016.8.26.0483

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