A coisa julgada no novo Código de Processo Civil, por Giovana Andreoli Gay

Código de Processo Civil de 2015 trouxe diversas mudanças às normas processuais brasileiras, todavia, um ponto que merece destaque refere-se à coisa julgada.
Numa breve análise à evolução histórica do instituto, verificamos que a coisa julgada, inicialmente, era configurada basicamente como a "presunção da verdade", na qual a sentença irrevogável era considerada absolutamente verdadeira nos fatos e no Direito. Após alguns anos, esta passou a ser considerada como um efeito da sentença. E, em sua terceira e atual teoria, a "res judicata" definiu-se não apenas como um mero efeito da sentença, mas sim, como uma qualidade de indiscutibilidade e imutabilidade que adere aos efeitos dodecisum.
Neste sentido, o Novo Código de Processo Civil em seu artigo 502 dispõe que "denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso".
Embora os termos assinalados sejam parecidos, convém mencionar que o legislador utilizou a palavra "imutabilidade" para definir a impossibilidade de a coisa julgada ser desfeita ou alterada. Por sua vez, a "indiscutibilidade" relaciona-se à impossibilidade de questionar o que já foi decidido e transitou materialmente em julgado.
Ocorre que, com a inserção do Novo Diploma Processual, uma questão entrou em discussão entre os doutrinadores quanto à extensão dessa imutabilidade, haja vista o disposto no §1º do artigo 503, ex vi:
"Art. 503 - A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.
§ 1º O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se:
I - dessa resolução depender o julgamento do mérito;
II - a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;
III - o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal. (g.n.)"
No Código anterior, era incontroverso que somente o dispositivo da decisão transitava em julgado. Entretanto, a partir do novo texto, entende-se que a imutabilidade e a indiscutibilidade alcançam os motivos da sentença no tocante à questão prejudicial, partindo da premissa que a resposta jurisdicional foi concluída.
Estendendo a imutabilidade aos motivos da sentença, segundo o Professo Marcelo Pacheco Machado, "temos a pacificação do conflito com maior amplitude, evitando o surgimento de novos processos (eficácia negativa da coisa julgada) e simplificando o julgamento de mérito de outros (eficácia positiva da coisa julgada)".
Nesse contexto, os que defendem a coisa julgada sobre questões prejudiciais estão preocupados com a utilidade e com o efetivo rendimento do processo.
Por sua vez, com a restrição da coisa julgada ao objeto litigioso do processo (delimitado pelo pedido e causa de pedir), há melhores condições de identificar quais matérias serão imutabilizadas com o julgamento de mérito.
A dúvida que prevalece é: como isto será aplicado na prática?
Como as demandas consideradas "de massa" poderão suportar a imutabilidade de decisões muitas vezes padrão, emanadas, principalmente, em Juizados Especiais, por conta da celeridade e dispensa de formalidades?
Ora, o operador do Direito deverá observar ponto a ponto de cada decisão e, caso verifique qualquer irregularidade ou fundamentação que vá de encontro ao seu interesse, deverá impugná-la para não sofrer as consequências, posteriormente, de uma questão supostamente discutida e resolvida?
Realmente não nos parece razoável!
Além disso, frequentemente nos deparamos com decisões absolutamente omissas aos questionamentos do postulante e, numa tentativa de reapreciação do juízo por meio de embargos aclaratórios, a fim de se observar, de fato, a petição erigida, este simplesmente rejeita-a, sob a justificativa de impossibilidade de reapreciação do mérito.
Resta patente, portanto, que o legislador se preocupou em estabelecer limites para que a coisa julgada se estabeleça quanto aos motivos da sentença, a fim de reduzir surpresas para as partes e gerar economia processual.

Entretanto, essa imutabilidade também exige maior atenção do juízo às questões apreciadas em sua integralidade, justamente para assegurar a efetiva aplicação do Direito

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