Alerta quanto ao agravo interno no novo CPC: multa fixada entre 1 e 5% do valor da causa, por Gabriel Nascimento Rodrigues de Freitas

É cediço que o agravo interno é o recurso cabível contra decisão monocrática prolatada pelo relator de recurso, a fim de submeter matéria em discussão à apreciação do respectivo órgão colegiado. Constitui objeto deste breve artigo a contradição entre (i) disposição legal relacionada à imposição de multa no julgamento unânime de improcedência de agravo interno e (ii) o esgotamento das vias recursais ordinárias como requisito de admissibilidade de recursos aos tribunais superiores.
Na transição do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973) para o Código de Processo Civil de 2015, que passou a viger em 2016 (NCPC), o agravo interno passou a ser objeto de capítulo (IV) próprio, dentro do título (II) dos recursos, no livro (III) que trata dos processos nos tribunais e dos meios de impugnação das decisões judiciais.
Demanda atenção dos operadores do direito a ocorrência de uma leve – porém, significativa – alteração na redação do dispositivo que prevê a aplicação de multa nos julgamentos de agravo interno.
O artigo 557, §2º, do CPC/73 dispunha que “quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor”.
O artigo 1.021, §4º, do NCPC, ora vigente, dispõe que “quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa”.[1]
A interpretação literal do conteúdo do novo dispositivo causa preocupação às partes e, igualmente, aos seus respectivos advogados, na medida em que a interposição do agravo interno, ainda que devidamente fundamentado, envolve o risco de julgamento de improcedência em votação unânime do órgão colegiado (câmara ou turma) e, consequentemente, por esse simples fato, o risco de imposição de multa fixada entre um e cinco por cento do valor da causa.
Tal interpretação literal, contudo, não parece acertada, especialmente, em razão da contradição com a exigência dos tribunais superiores de que sejam esgotados os recursos ordinários antes da interposição dos recursos especial e/ou extraordinário (artigos 102, inciso III e 105, inciso III, da Constituição da República).
O esgotamento das vias recursais ordinárias é objeto de súmula tanto no Supremo Tribunal Federal, que dispôs que “é inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na Justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada” (Súmula 281, aprovada na Sessão Plenária de 13/12/1963, Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 128) quanto no Superior Tribunal de Justiça, que dispôs que “é inadmissível recurso especial quando cabíveis embargos infringentes contra o acordão proferido no tribunal de origem” (Súmula 207, Corte Especial, julgado em 01/04/1998, DJ 16/04/1998, p. 44).
Ademais, na vigência do CPC/1973, havia entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento de recursos repetitivos (tema 434), no sentido de que “o agravo interposto contra decisão monocrática do Tribunal de origem, com o objetivo de exaurir a instância recursal ordinária, a fim de permitir a interposição de recurso especial e do extraordinário, não é manifestamente inadmissível ou infundado, o que torna inaplicável a multa prevista no art. 557, § 2º, do Código de Processo Civil”.
De fato, diante da exigência dos Tribunais Superiores de que se esgotem as instâncias recursais ordinárias e, diante de decisão monocrática, da necessária interposição de agravo interno para esta finalidade, não é cabível a aplicação de multa ao agravante, ainda que o julgamento de improcedência resulte de votação unânime do órgão colegiado.
Entende-se que a norma objeto de apreciação neste artigo pretende exercer função inibitória, de maneira a dissuadir quem pretenda a mera procrastinação com a interposição de recurso, bem como pretende conceder maior celeridade à prestação jurisdicional, no intuito do NCPC como um todo. No entanto, há que se ver como regular e legítima – e, portanto, não passível de sanção/multa – a interposição de recurso pelo jurisdicionado que visa a cumprir com os requisitos de admissibilidade exigidos pelos tribunais superiores.
Espera-se, por fim, que a jurisprudência gradualmente sedimente o entendimento de que a multa prevista no § 4º acima referido somente é cabível nas hipóteses de manifesta inadmissão do recurso e não deve ser aplicada às hipóteses de julgamento de improcedência unânime do recurso, apesar da literalidade da lei, evitando-se a contradição com os dispositivos que tratam da admissibilidade dos recursos aos tribunais superiores e, notoriamente, respeitando-se o princípio do acesso à justiça.
Enquanto esse entendimento não toma forma, aconselha-se cautela aos advogados que, acostumados ao regramento do CPC/1973, quase que automaticamente interpunham o agravo interno diante de decisões monocráticas. Com o NCPC, a questão da multa de um a cinco por cento, prevista no artigo 1.021, § 4º, especialmente em processos que envolvam valores consideráveis, é uma variável importante a considerar, em conjunto com os clientes, na decisão a respeito da interposição de recurso.
———————————————————————————————–
[1] No § 5º do mesmo artigo 1.021 do NCPC, foi mantido que “a interposição de qualquer outro recurso está condicionada ao depósito prévio do valor da multa prevista no § 4o, à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que farão o pagamento ao final”.

Comentários