O uso da mediação para conflitos entre sócios de escritórios de advocacia, por Caio Eduardo de Aguirre
A
mediação é uma ferramenta extremamente útil para tratar diversos tipos
de conflitos. Um deles é o surgido entre advogados sócios em escritórios
de advocacia.
É comum, sobretudo em grandes bancas, a saída repentina de advogados, o que frequentemente ocorre de forma não amistosa.
Também em
escritórios de porte menor, constituídos por sócios que muitas vezes são
amigos de longa data e que, justamente por isso, optaram por empreender
esforços profissionais de forma conjunta, a desavença costuma ocorrer e
a sociedade pode terminar de forma desastrosa.
Quando isso acontece, a escolha do caminho litigioso para solucionar pendências como o pagamento de haveres é quase automática.
Todavia, tanto o
processo judicial como a arbitragem são formatos no qual a beligerância
impera e a decisão é imposta por um terceiro que não os próprios
ex-sócios.
Decorrência disso
é uma batalha judicial – ou arbitral – que trará a todos um enorme
desgaste financeiro e emocional. A harmonia dos anos iniciais se
converte em guerra na qual os litigantes, até por estarem em seu habitat
quase natural, irão empreender todos os esforços para minar e liquidar o
antigo sócio. Se o bom advogado se empenha normalmente na defesa
processual de seus clientes, fará o possível e o impossível para
"vencer" o seu próprio caso.
O paradoxo é que
em muitas situações ambos os lados querem, genuinamente, solucionar o
problema de forma consensual, sem briga, mas não conseguem fazê-lo. A
emoção envolvida na situação impede qualquer tipo de comunicação
racional em direção ao acordo.
Como pontua o
mediador americano Joseph Folger, pessoas em conflito encontram-se
frágeis, confusas, inseguras e autocentradas. Isso as torna cada vez
mais fechadas e sem possibilidade de enxergar pontos de vista alheios, o
que atrapalha o entendimento. Está também provado que a emoção atua de
forma seletiva, fazendo com que a pessoa deixe de perceber possíveis
saídas para o problema no qual está inserida.
Some-se a isso o
fato de que o processo litigioso acaba aumentando o conflito. Quanto
mais uma parte apresenta seus argumentos, mais a outra os rebate, o que
obriga a primeira a não só reafirmar o ponto de vista que expôs, mas
também a encontrar novos argumentos para defender sua posição inicial. O
conflito escala! E isso se torna um círculo vicioso que se
retroalimenta, dificultando a percepção de possíveis alternativas.
O processo
litigioso impede, ainda, que os motivos subjacentes ao conflito venham à
tona e sejam abordados, o que inviabiliza o debate sobre as verdadeiras
causas do problema.
Um dos pontos
mais importantes da mediação, e comum a todas as escolas que estudam o
tema, é a concepção de que o conflito aparente contém também aspectos
ocultos. Uma coisa é o pedido judicial levado ao julgador, outra são os
reais motivos que conduziram à discórdia.
Ao longo do
relacionamento entre sócios é natural que muitas divergências surjam.
Mas isso, se não trabalhado, se não conversado, pode gerar um acúmulo de
descontentamentos que irá eclodir mais à frente e conduzirá a uma
situação de rompimento. Pequenas retaliações cotidianas, ausência de
reconhecimento, decisões unilaterais, entre outras práticas, podem levar
a uma situação futura de conflito. Para complicar o quadro, num
relacionamento prolongado e conturbado o diálogo normalmente é
interrompido ou passa a ter péssima qualidade, de forma que as causas da
discordância acabam sendo mascaradas e as próprias partes não sabem
mais porque estão brigando.
A abordagem do
Judiciário nesses casos não tem o desejável alcance aprofundado. Ao Juiz
é até mesmo vedado imiscuir-se nos aspectos ocultos do conflito. A
análise se limitará ao que tiver sido apresentado pelas partes. Mas,
como se disse, nem mesmo elas conseguem ao certo perceber de forma ampla
e segura o que está ocorrendo.
Nesse sentido,
quando a sentença é proferida resolverá o processo, mas não o conflito, o
que acarretará no não cumprimento espontâneo da decisão e na utilização
de todos os estratagemas possíveis, processuais ou não, para deixar de
acatar o decidido.
Já a perspectiva da mediação é diferente.
Esse método, que
se pauta pela informalidade e pela ampla autodeterminação das partes,
permitirá que os reais motivos do conflito venham à tona.
A presença de um
mediador devidamente capacitado e o ambiente propício ao diálogo
empoderará as partes, vale dizer, as tornará mais cientes da situação
conflituosa na qual estão inseridas, capacitando-as para que elas
próprias encontrem a melhor solução para o caso. Exercendo esse
protagonismo sobre o procedimento e sobre a solução do caso, é natural
que os envolvidos no conflito tenham um comprometimento maior com o que
decidirem.
Mas, é bom que se
diga, a mediação não é a taboa de salvação para todos os problemas. É
indicada para determinadas situações, como aquelas nas quais as partes
mantêm ou mantiveram uma relação continuada, a exemplo dos sócios.
Caberá ao advogado que assessorar as partes identificar se ela é
realmente o método mais adequado para o caso que se apresenta.
Importante dizer
também que a mediação implica menor desgaste emocional quando comparada
ao processo judicial e à arbitragem. O fim da sociedade pode vir de
forma de menos traumática, o que se traduz em grande vantagem para
sociedade de advogados.
Ter um ex-sócio é
muito melhor do que ter um atual inimigo. Ex-sócios não necessariamente
têm de ser adversários. Pelo contrário, algumas firmas de advocacia vêm
implantando políticas de aproximação e manutenção de relacionamento com
os ex-sócios. Dessa forma, só têm a ganhar. O ex-sócio de ontem pode
ser o parceiro de negócios de hoje.
Ademais, a imagem
da banca junto ao mercado ou perante seus colaboradores internos é bem
menos arranhada se o término da sociedade ocorrer de forma consensual,
seja porque o procedimento é sigiloso, seja porque um processo judicial
envolvendo o antigo sócio definitivamente não reflete bem junto aos
ex-parceiros de trabalho que ainda permaneceram no escritório, podendo
gerar clima de insegurança e de insatisfação.
Enfim, pode-se afirmar seguramente que as vantagens da mediação são muitas, sendo as acima mencionadas apenas alguns exemplos.
Não à toa a
própria OAB/SP disponibiliza, em sua Câmara de Mediação, Conciliação e
Arbitragem, mediadores para casos como esses. Nota-se, ainda, um visível
aumento do número de câmaras privadas e de mediadores.
Quando usada nas
hipóteses adequadas e por profissionais habilitados, a mediação pode ser
altamente útil para dirimir controvérsias entre sócios advogados.
Arrisca-se a dizer: a mediação veio para ficar e é um movimento que não
tem volta.
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