Carro de empregado estacionado na empresa, de quem é a responsabilidade? Por Kauan Pirolla Advocacia e Consultoria

Com toda certeza você já viu, ou pelo menos ouviu alguém falar, sobre algum shopping center, supermercado, loja, ou outro ponto comercial que tenha uma placa isentando-se de responsabilidade civil em seus estacionamentos.
Porém, essas placas não tem função alguma, tendo em vista que o ponto comercial tem total responsabilidade por qualquer dano, furto, roubo, ou similar que venha a acontecer aos carros estacionados em seu estabelecimento. Pois, parte-se do princípio que o estacionamento privado é inspecionado pelo estabelecimento enquanto o cliente o visita, independentemente de o cliente efetuar a compra ou não.
Este é um ponto pacífico na jurisprudência pátria, mesmo que desconhecidos por muitos. Podemos definir este dissabor com o carro no estacionamento da empresa como um dano em decorrência do serviço prestado (estacionamento privado). Neste sentido, o art. 14CDC dispõe que a empresa será responsável, independentemente de culpa, por danos causados por defeitos de sua prestação de serviço. Para corroborar este entendimento, temos a Súmula 130 do STJ que diz: "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estabelecimento."
Desta forma, fica claro a responsabilidade da empresa quando acontece algo ao carro de seu cliente quando este está em seu estacionamento. Contudo, e quando acontece algo ao carro de algum funcionário da empresa, que esteja no estacionamento desta. A empresa terá responsabilidade civil?
Seguindo uma linha de pensamento coerente, acredito que deveremos trabalhar com a analogia, haja vista que é de responsabilidade da empresa zelar por todos carros que estão em seu estacionamento, ainda que o carro pertença à um de seus funcionários. Mesmo não existindo a relação de consumo entre a empresa e o empregado, o estacionamento privado que a empresa fornece deve ser objeto de guarda, uma vez seus clientes deixam seus carros ali e esperam pegá-los da forma que o deixaram.
Isto posto, é importante apontar as jurisprudências nesse sentido:
RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FURTO DO VEÍCULO DO EMPREGADO NO ESTACIONAMENTO DA EMPRESA. O eg. Tribunal Regional consignou ser devida a indenização por danos morais, na medida em que, ante o furto do veículo do reclamante nas dependências da reclamada, a empresa tem responsabilidade, uma vez que, conforme depoimento do preposto, -o estacionamento era objeto de permanente guarda, monitoramento e vigilância-. A controvérsia não foi dirimida à luz do encargo probatório, de modo que não há que se falar em violação dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC. Assim, afasta-se a possibilidade de conhecimento do recurso com base no art. 896, c, da CLT. Recurso de revista não conhecido. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE CREDENCIAL SINDICAL.
Na Justiça do Trabalho, os honorários advocatícios são devidos tão somente nos termos da Lei nº 5.584/70, quando existentes, concomitantemente, a assistência do Sindicato e a percepção de salário inferior ao dobro do mínimo legal ou a impossibilidade de se pleitear em juízo sem comprometimento do próprio sustento ou da família. Constatado que o reclamante não se encontra assistido por sindicato de sua categoria, dá-se provimento ao recurso de revista, para excluir da condenação os honorários advocatícios. Incidência das Súmulas nºs 219 e 329 do c. TST e da Orientação Jurisprudencial nº 305 da SBDI-1 desta Corte. Recurso de revista conhecido e provido.
(TST - RR: 35606420125120035, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 14/05/2014, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/05/2014)
E também:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO - FURTO DE VEÍCULO DO EMPREGADO EM ESTACIONAMENTO DA EMPRESA - MATÉRIA NÃO ALEGADA EM CONTESTAÇÃO - PRECLUSÃO - IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NESTE GRAU DE JURISDIÇÃO - BOLETIM DE OCORRÊNCIA - PRESUNÇÃO JURIS TANTUM DE VERACIDADE - AUSÊNCIA DE PROVA CONTRÁRIA - DEVER DE GUARDA - NEGLIGÊNCIA - RESPONSABILIDADE CIVIL - INCIDÊNCIA DA SÚMULA 130 DO STJ - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. O art. 515§ 1º, do Código de Processo Civil é preciso ao vedar a análise, em sede recursal, de matéria não suscitada na contestação, momento processual oportuno para dedução de todos os elementos de defesa. Reiteradamente, os Tribunais vêm decidindo que o boletim de ocorrência tem presunção juris tantum de veracidade, ou seja, até que se prove o contrário, é verdadeiro tudo o que foi nele declarado. "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento." (Súmula n. 130, do STJ). Existe responsabilidade civil da empresa pelo veículo do empregado subtraído do estacionamento, durante à prestação de serviço.
(TJ-SC - AC: 195380 SC 2005.019538-0, Relator: Wilson Augusto do Nascimento, Data de Julgamento: 16/12/2005, Terceira Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Apelação cível n., de Tijucas.)
Por fim, para sanar qualquer duvida acerca do caso, temos a decisão do Egrégio Tribunal de Justiça de Brasília onde traz claramente a responsabilidade da empresa de ressarcir os danos causados ao empregado devido à furto, roubo, avarias ao carros e afins:
JUIZADO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONSUMIDOR. FURTO NO INTERIOR DE VEÍCULO EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA RELAÇÃO JURÍDICA. FATO ADMITIDO EM PRIMEIRO GRAU. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA. NEXO CAUSAL E DANO MATERIAL COMPROVADOS. SÚMULA 130 DO STJ. CULPA CONCORRENTE. NÃO OCORRÊNCIA. SUBTRAÇÃO DE NOTEBOOK. OBJETO ESTRANHO A ESTRUTURA OU COMPOSIÇÃO DO CARRO OU MESMO EMPREGADO COMO SEU ADORNO. BEM DE EXPRESSIVO VALOR. INEXISTÊNCIA DE PROVA ACERCA DE SUA EXISTÊNCIA OU RAZÃO PARA SER DEIXADO DENTRO DO CARRO. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. EVENTO DANOSO. ART. 398 CC E SUMULA 54/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DOS ORÇAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
  1. A legislação processual civil veda às partes a mudança do pedido ou da causa de pedir em sede de recurso. Admiti-la implicaria ofensa ao princípio do contraditório, da ampla defesa e ao duplo grau de jurisdição. Recurso não conhecido nessa parte.
  2. A responsabilidade do fornecedor é objetiva no que tange aos danos sofridos pelos clientes em estacionamento sob sua administração, nos termos dos artigos  e 14º do Código de Defesa do Consumidor.
  3. Ademais, a jurisprudência pátria reconhece a responsabilidade da empresa, centro comercial, supermercado ou shopping center pelo dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento (súmula nº 130/STJ), sendo irrelevante se a oferta é gratuita ou onerosa, assim como o fato de ser cliente ou não (STJ/RESP 36.333/SP e RESP 43.620/SP).
  4. A responsabilidade pela guarda do veículo inclui os bens em seu interior, seja por ser direito do consumidor a efetiva reparação (art. VICDC), seja pelas perdas e danos envolverem o que efetivamente se perdeu e o que razoavelmente se deixou de ganhar (art. 402 e 403CC). E o dever de reparação do dano decorrente de ato ilícito é um princípio de direito (art. 927CC), sendo que a indenização mede-se pela extensão do prejuízo (art. 944CC).
  5. Comprovado o arrombamento de uma das portas do automóvel e a subtração de objetos, é legítima a pretensão de alcançar sua reparação junto ao proprietário e a empresa administradora do estacionamento, cujo espaço é mantido para atender as necessidades ou conforto dos seus clientes. Se o boletim de ocorrência e documentação trazida aos autos são hábeis a comprovar a presença do carro da autora no dia e hora do fato, restou provado o ato negligente, o nexo causal e o resultado danoso ocorrido.
  6. A culpa concorrente somente será reconhecida se comprovada a relação de causa e efeito entre ação ou omissão culposa do consumidor e o resultado danoso. A simples existência de bens no interior de um veículo não induz à culpa concorrente, devendo haver prova de que o comportamento do cliente contribuiu para o evento lesivo. E via de regra, quem estaciona em local especificamente destinado a conferir conforto e segurança ao cliente, parte do pressuposto da existência de vigilância humana e eletrônica, de modo a confiar em deixar objetos dentro do carro sem risco de serem subtraídos.
  7. Embora o ordenamento jurídico não deixe espaço para tergiversações sobre o dever de reparação integral do proprietário do estacionamento, o mesmo já não ocorre com relação a prova de bens que não guardem pertinência ou natureza de acessório do carro e teriam sido deixados no seu interior. Deve-se levar consideração ainda a razoabilidade e o que revela a experiência comum em dada circunstância.
  8. No caso em apreço, a autora afirmou que haveria um notebook dentro do carro, mas dessa prova não se desincumbiu, pelo contrário. Ao se aferir pela prova testemunhal, autora e a irmã vinham de um curso, onde o emprego do computador não era usual. Daí porque não houve explicação plausível para a posse do aparelho eletrônico na ocasião. E o valor expressivo do bem leva, via de regra, que as pessoas o carreguem consigo mesmo quando saem para o comércio ou mercado, pelo risco de subtração, a considerar os altos índices de furtos em carros nas áreas comerciais, conforme cotidianamente alardeado pelos meios de comunicação. A apresentação de nota fiscal comprovou a compra do notebook apenas e não que estaria no carro. Nesse contexto, o testemunho de parente da vítima do furto deve ser sopesado com reservas.
  9. Por se tratar de ato ilícito, os juros de mora incidem a partir do evento danoso (art. 398CC e Súmula 54/STJ). 8. Recurso conhecido e PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJ-DF - ACJ: 20141010005418, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 10/02/2015, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Publicação: Publicado no DJE: 04/03/2015. Pág.: 484).
Portanto, podemos observar que a empresa que disponibiliza estacionamento privado - tanto para o cliente, quanto para o seu funcionário - será responsável por qualquer dano, furto, roubo, ou similar que aconteça à algum carro ali estacionado.

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