Direito de Empresa: Estabelecimento Empresarial

O estabelecimento empresarial pode ser vendido pelo empresário que o titulariza, cujo contrato de compra e venda de estabelecimento denomina-se trespasse, sendo proposto, no meio empresarial, por meio da expressão “passa-se o ponto”.
Embora com efeitos econômicos idênticos, na medida em que são meios de transferência da empresa, o trespasse não se confunde com a cessão de quotas sociais na sociedade limitada ou alienação de controle de sociedade anônima. São institutos jurídicos distintos, uma vez que na cessão de quotas sociais de sociedade limitada ou na alienação de controle de sociedade anônima, o estabelecimento empresarial não muda de titular, continuando a pertencer à sociedade empresária, no entanto, tem a sua composição de sócios alterada, e no trespasse, o estabelecimento empresarial deixa de integrar o patrimônio de um empresário, o alienante, e passa a integrar o patrimônio de outro, o adquirente. O objeto da venda, no trespasse, é o complexo de bens corpóreos e incorpóreos, envolvidos com a exploração de uma atividade empresarial. Já na cessão de quotas ou alienação de controle, o objeto da venda é a participação societária.
Em relação à sucessão empresarial, pode ou não existir no trespasse, mas na transferência de participação societária não existe.

QUESTÃO DA SUCESSÃO

O direito de diversos países se preocupa em disciplinar a alienação do estabelecimento empresarial com a finalidade de tutelar os interesses dos credores.
Até a entrada em vigor do Código Civil brasileiro considerava-se que o passivo não integrava o estabelecimento e consequentemente a regra era a de que o adquirente não se tornava sucessor do alienante. Em principio, os credores de um empresário não podiam pretender o recebimento de seus créditos de outro empresário, em razão de este haver adquirido o estabelecimento do primeiro.
Dessa forma, admitia-se três hipóteses de sucessão, que eram: a assunção de passivo expressa no contrato, as dívidas trabalhistas e fiscais.
Com a entrada do Código Civil, o tratamento da matéria foi alterado e o adquirente do estabelecimento empresário passou a responder por todas as obrigações relacionadas ao negócio explorado naquele local, desde que regularmente contabilizadas, e cessa a responsabilidade do alienante por estas obrigações no prazo de um ano.
O contrato de estabelecimento empresarial deve ser registrado na Junta Comercial e publicado na imprensa oficial. Além disso, o direito brasileiro estabelece ao trespasse uma formalidade prévia ou concomitante, qual seja a anuência expressa ou tácita dos credores, dispensando-as apenas no caso de solvência do alienante, posterior à transação. No caso de descumprimento dessa formalidade, a consequência restará ao adquirente que poderá perder o estabelecimento em favor da coletividade de credores, caso o alienante tenha sua falência decretada. Perante a massa falida, a venda do estabelecimento empresarial realizada sem tais precauções e formalidades é ineficaz.
O adquirente, com o objetivo de evitar a ineficácia do trespasse e administrar diretamente os passivos de algum modo ligados ao estabelecimento que passa a assumir, costuma contratar com o alienante a assunção de todas as obrigações, inserindo cláusula que transfere ao adquirente a responsabilidade pela solução das dívidas pendentes ao alienante, ligadas ao estabelecimento transacionado, bem como pode estabelecer o oposto, determinando que o adquirente não assume nenhum passivo do alienante, ficando este obrigado em regresso a indenizá-lo caso um credor obtenha sua responsabilização em juízo.
Em relação a passivos de ordens trabalhista e tributária, a regular contabilização da dívida para fins de responsabilização do adquirente do estabelecimento empresarial não se exige.
Mudanças na propriedade da empresa não afetam os contratos de trabalho, permitindo ao empregado duas opções, quais sejam a de demandar o antigo proprietário do estabelecimento empresarial em que trabalhava, ou o atual. Quanto ao passivo fiscal, distinguem-se duas situações, que são: se o alienante deixa de explorar qualquer atividade econômica, ou se continua a exploração de alguma atividade, mesmo que diferente da explorada no estabelecimento vendido, nos seis meses seguintes à alienação. No primeiro caso, a responsabilidade do adquirente é direta, podendo o fisco cobrar dele todas as dívidas tributárias do alienante, originadas da atividade desenvolvida no local do estabelecimento. No segundo caso, o adquirente responde de forma subsidiária, sendo ela apenas no caso de falência ou insolvência do alienante. Todavia, em qualquer caso, a sucessão tributária somente se caracteriza se o adquirente continuar explorando, no local, idêntica atividade econômica do alienante. Se alterar o ramo de atividade do estabelecimento, não responde mais pelas dívidas fiscais do alienante, nem direta, nem subsidiariamente.

TRESPASSE E LOCAÇÃO EMPRESARIAL

O estabelecimento empresarial se encontra, na maioria dos casos, em prédio locado pela sociedade empresária. Nesse caso, o trespasse, necessariamente, envolve a cessão da locação, que depende de autorização do locador ou pode se ocasionar a rescisão desta em 90 dias seguintes à sua publicação. Desse modo, o adquirente do estabelecimento empresarial situado em imóvel locado deve negociar não apenas com o titular do fundo de empresa, o locatário, como também com o dono do imóvel, o locador, pagando eventualmente luvas a esse último.
O empresário, ao locar imóvel para instalação da empresa, deve negociar com o locador, no início do vínculo locatício, a inserção, no contrato de locação, da anuência prévia para eventual cessão ou outra disposição contratual que contemple sub-rugação, a fim de preservar a integridade de seu investimento. Caso não consiga essa condição negocial, ele poderá vir a ter dificuldades para recuperar o investimento, quando do trespasse, caso o locador imponha luvas excessivas para anuir com a cessão do vínculo locatício.

CLÁUSULA DE NÃO RESTABELECIMENTO

Em geral, o alienante do estabelecimento empresarial que se restabelece em concorrência com o adquirente acaba atraindo para o novo local de seus negócios a clientela formada no antigo local.
Embora exposto à concorrência geral, tal fato, importa prejuízo ao adquirente, uma vez que este pagou determinado valor ao alienante, em razão especificamente do aviamento do estabelecimento transacionado. O restabelecimento do alienante caracterizará enriquecimento indevido, e com o objetivo de evita-lo, é comum nos contratos de trespasse, bem como em outros atos empresariais, a inserção de cláusula proibitiva de restabelecimento do alienante. No entanto, se o mesmo documento contempla autorização expressa para o restabelecimento do alienante, sendo uma das condições tratadas pelas partes, deverá o adquirente suportar eventual perda de clientela, em razão do novo estabelecimento concorrente.
Dessa forma, se expresso o trespasse, não há dificuldades em estabelecer direitos e obrigações dos contratantes em relação à concorrência.
Predomina, portanto, no direito brasileiro, o entendimento de que, omisso o contrato de trespasse, deve-se reputar implícita a cláusula de não restabelecimento, não podendo o alienante concorrer com o adquirente pelo prazo de 5 anos subsequentes ao trespasse.
No entanto, o empresário que alienou o seu estabelecimento não pode ficar impedido de explorar atividades não concorrentes, ou ficar vinculado à obrigação de não fazer por prazo indeterminado ou sem delimitações geográficas. Portanto, se ele se restabelece em atividade não concorrente, ou para atender região inalcançável pelo potencial econômico do antigo estabelecimento, ou, ainda, depois de transcorrido prazo suficiente para o adquirente consolidar sua posição no mercado, não se verifica concorrência direta entre os participantes do contrato de trespasse, consequentemente, não há disputa da mesma clientela, nem enriquecimento indevido do alienante.

Comentários