Enquadramento de doenças no conceito de alienação mental para fins de isenção de Imposto de Renda, por Renan Palhares Torreão Braz
O entendimento jurídico sobre “alienação mental” para fins de isenção de Imposto de Renda pode abarcar: estados de demência, psicoses esquizofrênicas, paranóia, parafrenia, oligofrenias, bem como outros quadros clínicos graves que interfiram na vida psicossocial e laboral do indivíduo. Recomenda-se a busca pela declaração do benefício e pela devolução do tributo pago a maior.
É de conhecimento
amplo que se deve interpretar “literalmente a legislação tributária que
disponha sobre outorga de isenção” (art. 111, II, CTN).
Entretanto, quando a norma isentiva carece de um conceito preciso e não
possibilita, por si só, sua aplicação imediata, é necessário fazer o
uso de interpretação, para dar algum sentido à letra da lei.
Veja-se que, ao tratar de hipóteses de isenção de Imposto de Renda, a lei 7.713/88, em seu art. 6º, XIV1,
prevê isenção fiscal aos proventos de aposentadoria ou reforma
percebidos pelos portadores de alienação mental. A esse respeito, é
pacificado no âmbito do STJ que “o rol contido no referido dispositivo legal é taxativo (numerus clausus), vale dizer,restringe a concessão de isenção às situações nele enumeradas”
(REsp 1.116.620/BA, Rel. Ministro Luiz Fux, 1ª seção, julgado em
9/8/10, DJe 25/8/10. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/08).
O mesmo precedente aponta que “revela-se
interditada a interpretação das normas concessivas de isenção de forma
analógica ou extensiva, restando consolidado entendimento no sentido de
ser incabível interpretação extensiva do aludido benefício à situação
que não se enquadre no texto expresso da lei, em conformidade com o
estatuído pelo art. 111, II, do CTN”.
Em que pese o dever
de homenagem à literalidade da matéria, não há como se identificar, com
exatidão, o indivíduo acometido por “alienação mental”, conforme alude o
dispositivo.
Com maior clareza, verifica-se que, "segundo
explicita a doutrina, a alienação mental não constitui, de fato, uma
doença em seu sentido estrito, mas um estado cuja constatação depende,
antes de tudo, de um diagnóstico médico específico e afirmativo, que
primeiro reconheça a existência de uma moléstia e depois,
principalmente, a sua conformação à hipótese legalmente estabelecida"
(TRF 3ª região, Órgão Especial, MS 0013142-03.2010.4.03.0000, Rel.
Desembargador Federal Carlos Muta, julgado em 14/3/12, e-DJF3 Judicial 1
Data:20/3/12).
Por conseguinte, é
factível a hipótese de constatação, por laudo médico, da condição de
indivíduo alienado mental não acometido por alienação mental, como
acontece quando este é incapacitado ao exercício de atividades laborais,
em caráter definitivo, conquanto mantenha as condições de saúde mental
para exercer os direitos e deveres da vida civil.
A título
exemplificativo, a verificação de Transtorno Bipolar de Humor Tipo II
pode caracterizar o indivíduo como mero portador de transtorno mental
(CID F31.5), mas não em condição determinante de alienação mental, já
que, além do exercício da vida civil, é possível verificar sua atividade
intelectual, se estudante de nível superior e docente concursado, por
exemplo (AC 0024272-43.2007.4.01.3300/BA, Rel. Desembargador Federal
Novély Vilanova, Rel.Conv. Juíza Federal Lana Lígia Galati (Conv.), 8ª
turma, e-DJF1 p.937 de 13/3/15) .
Em tom elucidativo,
a portaria 1.675/MPOG, de 6/10/06, pelo seu Manual para Serviços de
Saúde dos Servidores Civis Federais, prescreve que “alienação Mental é
um estado de dissolução dos processos mentais (psíquicos) de caráter
transitório ou permanente (onde o volume de alterações mentais pode
levar a uma conduta antisocial), representando risco para o portador ou
para terceiros, impedindo o exercício das atividades laborativas e, em
alguns casos, exigindo internação hospitalar até que possa retornar ao
seio familiar. Em geral estão incluídos nesta definição os quadros
psicóticos (moderados ou graves), como alguns tipos de esquizofrenia,
transtornos delirantes e os quadros demenciais com evidente
comprometimento da cognição (consciência, memória, orientação,
concentração, formação e inteligência)”.
Entende-se que a
alienação mental não será decorrência de qualquer doença psiquiátrica,
tampouco expressa uma patologia específica, vez que reflete o estado de “alteração
completa ou considerável da personalidade, comprometendo gravemente os
juízos de valor e de realidade, bem como a capacidade de entendimento e
de autodeterminação, tornando o indivíduo inválido total e
permanentemente para qualquer trabalho (Portaria 797 MPOG, de
22/03/2010)” (TRF 3ª Região, Órgão Especial, MS
0013142-03.2010.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal Carlos Muta,
julgado em 14/3/12, e-DJF3 Judicial 1 Data:20/3/12).
Nessa linha, é
possível identificar abertura da jurisprudência à caracterização da
alienação mental a partir da constatação do Mal de Alzheimer: “Tendo o
Tribunal de origem reconhecido a alienação mental da recorrida, que
sofre do Mal de Alzheimer, impõe-se admitir seu direito à isenção do
imposto de renda” (REsp 800.543/PE, Rel. Ministro Francisco Falcão,
1ª turma, julgado em 16/3/06, DJ 10/4/06, p. 154), já considerada a
doença espécie do gênero “Alienação Mental” (TRF 3ª Região, Quarta
Turma, Apelreex 0007896-25.2011.4.03.6100, Rel. Desembargadora Federal
Mônica Nobre, julgado em 11/6/15, e-DJF3 Judicial 1 Data:24/6/15).
Recomendações daPortaria Normativa
1174/MD, de 6/9/06, instituindo o Manual do Ministério da Defesa para
Perícias e Auditorias Médicas no Distrito Federal, bem como da Portaria
n. 1.675/MPOG, de 6/10/06, pelo seu Manual para os Serviços de
Saúde dos Servidores Civis Federais, convergem ao exigir à
caracterização da alienação mental:
a) seja enfermidade mental ou neuromental;
b) seja grave e persistente;
c) seja refratária aos meios habituais de tratamento;
d) provoque alteração completa ou considerável da personalidade;
e) comprometa gravemente os juízos de valor e realidade, com destruição da autodeterminação e do pragmatismo;
f) torne o paciente total e permanentemente inválido para qualquer trabalho;
g) haja um eixo sintomático entre o quadro psíquico e a personalidade do paciente;
Por conseguinte, concluem ser “necessariamente casos de alienação mental”:
a) estados de
demência (senil, pré-senil, arterioesclerótica, luética, coréica, doença
de Alzheimer e outras formas bem definidas);
b) psicoses esquizofrênicas nos estados crônicos;
c) paranóia e a parafrenia nos estados crônicos;
d) oligofrenias graves.
O enquadramento do
aposentado, reformado ou pensionista em um desses quadros clínicos, bem
como em outros que possam se afigurar às características comentadas,
pode indicar a satisfação do critério jurídico de “alienação mental”
para fins de isenção de imposto de renda, o que recomenda a busca pela
declaração do direito ao benefício, bem como à repetição do tributo já
pago indevidamente, se for o caso, administrativamente e até via
intervenção judicial, se necessária.
Parabéns pelo artigo. lúcido e pontual...
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