Direitos do embrião,por Eudes Quintino de Oliveira Júnior

O Direito é uma ciência que não se esgota em uma única dimensão. Assim, por ser evolutivo e protetivo, todo fato novo com relevância social reclama sua participação, com a utilização de ferramentas próprias para a alcançar a eficácia da medida.
A 5ª câmara de Direito Civil do TJ/SC decidiu pela procedência do pedido de indenização referente ao seguro DPVAT. Isto porque, em razão de um acidente automobilístico, a autora da ação contava com 37 semanas de gestação, quando ocorreu a morte do nascituro. A decisão foi calcada na interpretação do disposto no art. 2º do CC: "A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro".
O embrião surge como agente de tutela estatal em várias oportunidades. A Declaração dosDireitos da Criança, promulgada pela Assembleia Geral da ONU, preconiza que a criança,em razão de sua imaturidade física e mental, necessita de proteção legal apropriadatantoantes como depois do nascimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente acrescenta aindadireito de proteção à vida e à saúde, proporcionando um nascimento sadio e harmonioso,em condições dignas de existência.
 não se pode limitar o direito do nascituro apenas ao de nascer. E sim ampliá-lo e agregarele o nascer com dignidadecom saúdecom a proteção estatal necessáriaextensiva àsua mãe, de quem é dependente na vida pré-natal. Pode o embrião, desta formapelaprojeção alcançada, figurar como interessado em ação de alimentosinvestigação depaternidade e outros direitos compatíveis com sua condição de concebido, mas não nascido.
Tanto é que a lei 11.804/08, conhecida impropriamente como "alimentos gravídicos", conferedireito à mulher gestantenão casada e que também não viva em união estável, de receberalimentosdesde a concepção até o partoPara tanto, deverá ingressar com o pedido judicialem desfavor do futuro pai. O juiz decidirá, no âmbito de uma cognição sumáriacom baseem indícios de paternidade, a obrigação alimentar do suposto paique poderá contestarmasem restrito núcleo cognitivo também.
Agora, no entanto, em razão evolução da engenharia genética, já é possível a realização no Brasil de exame não invasivo consistente na procura do DNA fetal circulante na mãe e compará-lo com o material fornecido pelo pretenso pai. O avanço científico é tamanho
que, além do objetivo da paternidade, carrega precisão quase que incontestável no sentido de demonstrar que o embrião seja portador de síndromes de Down, Edwards, Patau, Turner, Klinefelter e Triplo X.
O nascituro, conforme se extrai do regramento pátrio, tem seus direitos preservados, porém não é detentor de capacidade jurídica. Tanto é verdade que, se não tiver pai e a mãe não for a responsável pelo poder familiar, a ele será nomeado um curador, que poderá, dentre outros direitos, representá-lo como donatário e pleitear em favor dele assistência médica. Defere-se ao embrião uma tutela sui generis. O status conferido a ele é totalmente divorciado daquele preconizado pelos romanos, no sentido de que o feto é apenas parte dasvísceras da mulher – pars viscerum matris –e que dele podia dispor, de acordo com suaconveniência, poisenquanto não fosse dado à luz não seria considerado ser humano.
Tramita pelo Congresso Nacional o PL 478/07, dos deputados Luiz Bassuma (PT/BA) e Miguel Martini (PHS-MG), que dispõe sobre o Estatuto do Nascituro e foi aprovado pela Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados. Define o nascituro como sendo o ser humano concebido, mas não nascido, compreendendo aquele concebido "in vitro" ou por qualquer outro meio científico eticamente aceito. A respeito da personalidade humana estabelece que a adquire com o nascimento com vida, mas sua natureza humana é reconhecida desde a concepção, conferindo-lhe proteção jurídica através do estatuto, da lei civil e penal. É a repetição do pensamento do médico francês Jérôme Lejeune, pai da genética moderna, responsável pela descoberta de um cromossomo a mais sobre o par 21, quando avaliava uma criança com Síndrome de Down. Sua revelação, porém, contra sua vontade, começou a trilhar pela interrupção da gravidez de embriões portadores da doença. Veio a público defender o pensamento que, mesmo sendo um embrião portador de doença, deveria ser respeitado desde sua concepção até sua morte natural, em nítida luta contra o aborto.
Desta forma, por meio do Direito, o homem vai extrapolando o próprio conceito de concepção e vida humana e novos caminhos vão se abrindo para conferir ao embrião uma tutela mais abrangente. O direito à vida é inerente à pessoa humana e, pelo seu caráter de indisponibilidade, merece proteção desde a concepçãocom o direito de nascerApósemtodas as suas fasesinfânciajuventudemaioridadematuridade e velhice, o homemcontinua recebendo a proteção legal compatível com seu estágio e vai acumulando direitosaté se transformar numa fonte inesgotávelchamada de sujeito pleno de direitos.

Desta forma, o embriãoem sua clausura silenciosa, tem voz suficiente para transformar omundo exterior para que possa recebê-lo com a pompa merecida e, principalmentepara quesua mãe possa ter as melhores condições de vida e saúde para gerá-lo. É um sujeito sempersonalidade jurídica própriamas com muita personalidade, convenhamos. Mesmo sem ternascido, projeta-se como uma pessoa humana. É bom não esquecer que o homem de hojefoi o embrião de ontem.

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