A
consequência natural do processo de execução é a satisfação do crédito
exequendo. O curso do processo todo tende a este fim e, muitas vezes,
por haver no patrimônio do devedor somente bens imóveis, de difícil
liquidação, surge a necessidade de alienar bens imóveis em hasta pública
para que o credor seja satisfeito.
A lei processual
estabelece diversos requisitos para que o ato da alienação em hasta
pública seja revestido de segurança jurídica que forneça ao arrematante a
tranquilidade necessária para comprar o bem nesta modalidade de
alienação com a certeza de que terá em mãos um bem desembaraçado de
eventuais dívidas, coisas e pessoas e que se preste ao fim colimado,
seja investimento ou uso próprio.
A segurança
jurídica da alienação em hasta pública interessa a todas as partes e à
sociedade como um todo, pois coloca fim a um processo custoso e
restabelece o equilíbrio patrimonial com a satisfação do crédito do
exequente.
Não é à toa que a
lei processual estabelece que o edital de alienação em hasta pública
deve trazer diversas informações, que servem para que o potencial
arrematante analise o imóvel e sua viabilidade, com base no preço da
avaliação. As informações de essencial divulgação são, entre outras, a
descrição do bem com remissão à matrícula e registro, o valor do bem e a
menção da existência de ônus.
Já a lei tributária
garante ao arrematante que há a sub-rogação dos créditos tributários
sobre o respectivo preço da arrematação (Art. 130 CTN).
As garantias legais
que cercam a alienação e hasta pública, como já dito anteriormente, são
essenciais à segurança jurídica desta modalidade de alienação e
protegem o próprio processo judicial de execução, à medida que
incentivam interessados à arrematar os bens e pôr fim a processos que,
de outra forma, se acumulariam durante décadas nas estantes dos fóruns.
É por isso que
vemos com estranheza a decisão que flexibiliza as normas acima
mencionadas em detrimento do arrematante. Em decisão proferida no agravo
1.412.944, da relatoria do ministro Benedito Gonçalves, publicado em
8/2/12, o ministro entendeu que, havendo expressa menção no edital
acerca da existência de débitos condominiais e tributários incidentes
sobre o imóvel arrematado, a responsabilidade pelo seu adimplemento
transfere-se para o arrematante.
Ora, tal decisão
fere as normas que disciplinam a questão e traz insegurança aos
potenciais arrematantes que, muitas vezes só arrematam os imóveis porque
têm a certeza de que as dívidas incidentes no mesmo serão sub-rogadas
no produto da arrematação, já que as dívidas de condomínio e de imposto
podem tão altas a ponto de inviabilizar a arrematação de imóveis nessa
situação.
A decisão
mencionada está na contra mão da tendência da justiça moderna. Veja que
em recente julgado da relatoria da Nancy Andrighi (REsp 1.092.605-SP,
Rel. Min.), a turma, ao dar provimento ao recurso especial, consignou
que o arrematante não responde pelas despesas condominiais anteriores à
arrematação do imóvel em hasta pública que não constaram do edital da
praça. Salientou-se que, nesse caso, os referidos débitos sub-rogam-se
no valor da arrematação (assim como ocorre com os débitos tributários
nos termos do art. 130, parágrafo único, do CTN), podendo o arrematante
requerer a reserva de parte do produto da alienação judicial para pagar a
dívida. Segundo a ministra relatora, responsabilizar o arrematante por
eventuais encargos incidentes sobre o bem omitidos no edital compromete a
eficiência da tutela executiva e é incompatível com os princípios da
segurança jurídica e da proteção da confiança. Ressaltou que, embora o
art. 694, § 1º, III, do CPC
estabeleça que a existência de ônus não mencionados no edital pode
tornar a arrematação sem efeito, é preferível preservar o ato mediante a
aplicação do art. 244 da lei processual civil.
Ora, corretíssima a
decisão, já que o edital é o aval do poder judiciário para que o
arrematante compre o bem com tranquilidade. Se o comprador adquiriu
imóvel com garantia expressa do Poder Judiciário de que as dívidas
condominiais não seriam de sua responsabilidade, ele não pode ser
cobrado posteriormente por conta dessas dívidas.
No mesmo julgado, a
ministra ainda avaliou que, mesmo em hipóteses diferentes da julgada, a
interpretação da lei que autoriza a transferência para o arrematante
dos débitos condominiais de imóvel adquirido em juízo pode ser
prejudicial ao sistema. Isso porque tal interpretação afastaria o
caráter de garantia do imóvel, fazendo com que, em vez de viabilizar a
redução da dívida, ela seja eternizada.
Em seu voto, a
ministra deixa clara a necessidade da garantia à segurança jurídica da
alienação em hasta pública à medida em que explicou que "basta
pensar num exemplo simples: imaginemos uma situação em que o débito
tenha se acumulado de tal forma que seja maior que o valor do bem. Se
mantido o entendimento até aqui preconizado, nenhum credor se
interessará pela compra em juízo, já que o preço total desencorajaria
qualquer lance".
Ou seja, o respeito
à lei tributária que determina que as dívidas serão sub-rogadas no
produto da arrematação e ao entendimento que as dívidas condominiais
anteriores à arrematação devem ser sub-rogadas da mesma forma deve
prevalecer em nome da segurança jurídica e da efetividade do processo de
execução.
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