O presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB-AL), vai
receber, nesta quarta-feira (2/10), o anteprojeto que visa reformar a
Lei de Arbitragem. A comissão que elaborou o anteprojeto é composta por
21 juristas e presidida pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça
Luis Felipe Salomão. O objetivo é diminuir o número de processos na
Justiça e desafogar o trabalho dos juízes e tribunais. A Lei de
Arbitragem (Lei 9.307) completou 17 anos na segunda-feira (23/9).
Na
arbitragem, as partes em conflito escolhem um árbitro ou tribunal
arbitral para tomar a decisão, sem intervenção do Judiciário. A decisão
tem a mesma eficácia de uma sentença judicial estatal.
Desde o
início dos trabalhos da comissão, o ministro Salomão tem apontado a
arbitragem como alternativa necessária para dar mais agilidade aos
processos. O anteprojeto deverá propor a arbitragem para as questões que
envolvem contratos públicos, trabalhistas e de interesse dos
consumidores. Além disso, defende que o fortalecimento da arbitragem
seria um atrativo para investimentos estrangeiros no país, já que
contratos atraem mais investidores quando há certeza de que certos
problemas poderão ser resolvidos por meio de arbitragem.
Para Arnoldo Wald,
professor catedrático de Direito Civil da Faculdade de Direito da
Universidade do Rio de Janeiro (Uerj), faltavam explicações sobre alguns
pontos da lei que estavam sendo aceitos pela jurisprudência construtiva
dos tribunais. Wald cita como exemplo o cabimento da arbitragem em
relação a entidades de Direito Público. Além disso, era necessário
solucionar problemas como conflito de competências nos caso de medidas
cautelares.
Selma Lemes, uma das autoras do
anteprojeto que resultou na atual Lei de Arbitragem, afirma que o
regramento em vigor hoje não proíbe o uso do instituto em contratos com a
Administração Pública. "Assim está disposto na Lei Geral das
Concessões, das Parcerias Público-Privadas e é pratica usual em
contratos com financiamento por Bancos Internacionais de Fomento, como o
Banco Mundial", afirma. "Nunca houve restrição para a Administração
Pública eleger a arbitragem em contratos que versem sobre interesses
públicos derivados. Há parecer até de Rui Barbosa a respeito."
Ela
elogia a menção às questões societárias, quando o texto do anteprojeto
especifica como questões entre acionistas podem ser resolvidas pela via
arbitral. "São inovações importantes tratadas em uma lei específica, o
que poderia representar maior segurança às previsões da legislação
societária."
Já no que se refere à arbitragem nas relações de
trabalho, Selma alerta que é preciso ouvir partes interessadas, como os
sindicatos de trabalhadores e os patronais. Sugere cuidado também no
regramento de arbitragens entre consumidores e empresas. "Deveria
existir estrutura que contasse com o apoio do Estado, como funciona na
União Europeia, uma forma de facilitar o acesso à Justiça. Em 1999,
elaboramos proposta para o Ministério da Justiça iniciar um projeto
piloto, mas não houve interesse", lembra. "Arbitragens em relações de
consumo demandam foros apropriados, com custos reduzidos e até a
possibilidade de arbitragens gratuitas."
O anteprojeto consolida alguns entendimentos doutrinários e aperfeiçoa questões que deixavam dúvidas. A advogada Alessandra Cavalcanti Sabino,
especialista em arbitragem e mediação do Tostes e Associados Advogados,
cita como exemplo a participação da Administração Pública na
arbitragem. “A Lei da Parceria Público-Privada 11.079/2004, artigo 11,
III, já previa que conflitos entre Administração Pública e particular
contratado fosse solucionado por meio da arbitragem. A lei atual não
continha uma previsão expressa sobre a questão.” Segundo ela, o
anteprojeto trata especificamente das tutelas cautelares e de urgência,
que são as conhecidas cautelares pré-arbitais, instauradas antes do
procedimento arbitral e precisavam de regulamentação.
A previsão de compromisso arbitral em contratações administrativas também foi citada por Giuseppe Giamundo Neto,
especialista em Direito Administrativo e sócio do escritorio Edgard
Leite Advogados. Para ele, tal compromisso não apenas vai ao encontro da
evolução legislativa e doutrinária sobre a matéria, como também confere
maior segurança jurídica aos projetos do Poder Público, atraindo um
maior numero de investidores.
“A arbitragem será um instrumento
extremamente útil para assegurar a regularidade na execução de obras e
serviços públicos, facilitando a manutenção do equilíbrio
econômico-financeiro dos contratos, na medida em que possibilita que se
chegue rapidamente à composição dos conflitos envolvendo direitos
disponíveis, mediante decisões tomadas por especialistas no específico
assunto controvertido”, afirma Giamundo Neto.
Para Fábio de Possídio Egashira,
sócio do Trigueiro Fontes Advogados e membro do Comitê de Arbitragem do
Centro de Estudos das Sociedades de Advogados de São Paulo (Cesa-SP), a
Lei de Arbitragem precisava mesmo de ajustes. “A reforma será bem-vinda
e tocará em pontos importantes, tais como as tutelas cautelares e de
urgência, a comunicação entre o árbitro e o Poder Judiciário, a
utilização da arbitragem pela Administração Pública direta e indireta, o
que significará uma melhoria interessante na prática arbitral", disse.
Porém, o trabalho da comissão deve ser feito com cautela. Quem afirma é Luís André Azevedo,
especialista em Direito Comercial e presidente do Instituto de Direito
Societário Aplicado (IDSA). Segundo ele, o cuidado é necessário para
procurar preservar os inúmeros aspectos positivos de uma lei bem
sucedida.
Nesse sentido, Marcos de Miranda Martinelli,
do Rocha e Barcellos Advogados, faz um alerta para o risco de
modificações no projeto distorcerem os objetivos da lei. "A alteração de
uma lei que está dando certo implica em riscos de ocorrerem
modificações e distorções no trâmite do processo legislativo, passíveis
de prejudicar o bom andamento e desenvolvimento da arbitragem no país",
diz. Apesar disso, ele considera que vale a pena correr esse risco para
poder aumentar o escopo de aplicação da arbitragem no país.
Na opinião da sócia do L.O. Baptista Schmidt, Valois, Miranda, Ferreira, Agel, Adriana Braghetta, os aprimoramentos da comissão foram no sentido de aumentar as questões que são passíveis de ir para a arbitragem.
O advogado Rannery Lincoln Gonçalves,
do escritório Eduardo Antônio Lucho Ferrão Advogados Associados,
aprovou as alterações pontuais do projeto. “Modificaram o mínimo
possível, pois a lei já era boa. Notei que, em termos gerais, apenas
atualizaram-na com a jurisprudência que os tribunais vinham praticando.
Quanto à mediação, essa sim necessitava de regulação, visto que
inexistia, e pode ajudar muito que as partes, antes de recorrerem ao
Judiciário, tentem resolver o conflito pela mediação”, reconhece.
Propostas
Segundo o ministro Salomão, O anteprojeto prevê que a arbitragem possa ser usada em conflitos societários, com cláusula a ser instituída por Assembleia de acionistas, assegurado o direito de retirada dos sócios minoritários.
Segundo o ministro Salomão, O anteprojeto prevê que a arbitragem possa ser usada em conflitos societários, com cláusula a ser instituída por Assembleia de acionistas, assegurado o direito de retirada dos sócios minoritários.
Outra proposta é em relação à instituição da
arbitragem para as relações de consumo, restrita aos casos em que o
consumidor toma a iniciativa de invocar o instituto. Além disso, foi
incluída a possibilidade da arbitragem ser utilizada em contratos
trabalhistas, para aqueles que ocupem cargos de elevada hierarquia nas
grandes empresas. Em tais casos, o trabalhador apenas se submeterá a
arbitragem privada se der início ao procedimento.
O anteprojeto
propõe também a forma de interrupção da prescrição, e os meios de
interação do Poder judiciário com o árbitro, nas parte que trata das
tutelas de urgência e da carta arbitral.
Comentários
Postar um comentário