Conversa telefônica gravada por um dos interlocutores pode ser admitida como prova, decide 5ª Turma do TRT4
Quando
a gravação de conversa é feita por um dos interlocutores, não está
caracterizada interceptação telefônica, razão pela qual não se pode
considerá-la meio ilícito de obtenção de prova. Considera-se lícita a
gravação clandestina, mesmo que o ofendido seja um terceiro, que não
participou do diálogo, mas foi citado na conversa e obteve a prova por
intermédio do interlocutor". Com este entendimento, a 5ª Turma do
Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) condenou a Metalúrgica
Fratelli a pagar R$ 15 mil de indenização por danos morais por divulgar
informações desabonadoras sobre um ex-empregado. A principal prova
utilizada pelo trabalhador foi uma gravação realizada por sua esposa ao
ligar para uma sócia da reclamada, como se fizesse parte de uma outra
empresa que teria interesse em admitir o reclamante. Durante a ligação, a
sócia recomendou não contratar o ex-empregado porque ele ajuizou ação
trabalhista contra a empresa e, portanto, não era "confiável". Para os
desembargadores da 5ª Turma do TRT4, considerando-se o contexto, este
era praticamente o único meio de prova capaz de demonstrar a
discriminação a que o trabalhador era submetido, tendo prejudicado o seu
direito fundamental ao trabalho. A decisão reforma sentença do juiz
Cláudio Roberto Ost, da 1ª Vara do Trabalho de Santa Rosa, município do
noroeste do Rio Grande do Sul.
De acordo com
informações do processo, o empregado trabalhou para a Fratelli entre
março de 2001 e junho de 2003. Neste mesmo ano, segundo informou na
petição inicial, ajuizou ação trabalhista para cobrar inúmeros direitos
que teriam sido sonegados. Após realizar acordo com a empresa, conforme
relatou, passou a sofrer perseguições por parte dos proprietários, que
teriam advertido outras empresas da região sobre a ação ajuizada pelo
trabalhador e que este, portanto, não seria "confiável". O empregado
também afirmou que, ao procurar novo emprego, percebeu resistência por
parte das empregadoras, e que foi informado da existência de uma "lista
negra" com nomes de trabalhadores que ajuizaram ações contra a
reclamada.
Tal situação, ainda segundo as alegações
do reclamante, foi confirmada em abril de 2011, quando, já empregado na
Metalúrgica Candeia, recebeu ordem para ir até à Fratelli realizar uma
atividade e foi impedido de ingressar nas dependências da reclamada, que
ameaçou romper o contrato de prestação de serviços que mantinha com sua
atual empregadora caso o reclamante continuasse trabalhando no local.
Após uma semana do ocorrido, foi dispensado. Diante destes fatos,
providenciou a gravação juntamente com sua esposa, como meio de provar
que a reclamada divulgava informações desabonadoras sobre a sua pessoa e
pleiteando indenização por danos morais.
Sentença desfavorável
Ao
julgar o pleito em primeira instância, o juiz de Santa Rosa analisou,
primeiramente, se a gravação clandestina poderia ser aceita como prova
no processo. No entendimento do magistrado, a situação equivale a um
"flagrante preparado", já que a gravação da conversa foi provocada pelo
próprio reclamante e de maneira premeditada. Segundo o juiz, portanto,
não há prova de efetiva divulgação de informações desabonadoras, já que
se a situação não fosse arquitetada pelo reclamante as declarações da
sócia da empresa "sequer" existiriam. Para embasar seu entendimento,
citou decisões judiciais sobre o mesmo tema proferidas por outros TRTs e
pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Baseado nesta conclusão, julgou
improcedente a ação do reclamante, que decidiu recorrer ao TRT4 para
modificar a sentença.
Gravação admitida
Ao
relatar o caso na 5ª Turma, o desembargador Clóvis Fernando Schuch
Santos ressaltou que existem três correntes doutrinárias quando se trata
da admissão de provas constituídas por meios ilícitos, sendo duas delas
"extremistas": uma que preconiza a admissão de qualquer prova no
processo, com fundamento no interesse judicial para alcançar a verdade e
influenciar no convencimento do magistrado, e outra que defende a
inadmissibilidade absoluta de provas ilícitas, mesmo que não haja
vedação legal para a admissão.
Conforme o
magistrado, no entanto, existe uma corrente intermediária, que considera
fundamental a aplicação do princípio da proporcionalidade, analisando
os direitos e garantias em discussão e ponderando seus valores
jurídicos, já que a inadmissibilidade de uma prova poderia violar outros
direitos fundamentais, como o da dignidade da pessoa humana e do valor
social do trabalho. "Este Relator adota esta última posição, por meio da
qual o Magistrado deverá avaliar, no caso concreto, qual o princípio
que deve ser prestigiado em benefício da justiça da decisão e da
efetividade do processo", afirmou o julgador.
No
caso dos autos, segundo o relator, a gravação preparada pelo reclamante e
sua esposa deve ser admitida como prova, já que não se trata de
interceptação telefônica (quando nenhum dos interlocutores sabe da
gravação da conversa), mas sim de gravação clandestina, em que um dos
participantes tem ciência da gravação, mesmo que o beneficiado seja um
terceiro. O magistrado citou decisões neste sentido proferidas pelo
Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelo STF. Neste contexto, o
julgador decidiu pela condenação da empresa e determinou o pagamento da
indenização, no que foi acompanhado pelos demais desembargadores da
Turma.
Acórdão do processo 0001138-61.2011.5.04.0751 (RO)
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