A
Corte Europeia de Direitos Humanos decidiu que o sigilo nas
comunicações entre advogado e cliente não é absoluto e pode ser afastado
em alguns casos. Os juízes validaram norma da França que obriga os
advogados a delatar seus clientes se suspeitarem que estes estejam
envolvidos em esquemas de lavagem de dinheiro. A decisão foi anunciada,
nesta quinta-feira (6/12), por uma das câmaras de julgamento da corte e
ainda pode ser modificada pela câmara principal de julgamentos.
O
tribunal europeu julgou uma regulamentação da Ordem dos Advogados da
França que exige que os advogados colaborem no combate à lavagem de
dinheiro. De acordo com a regra da entidade, os defensores devem ficar
constantemente vigilantes e, diante de suspeitas do crime financeiro,
devem relatar às autoridades francesas, sob pena de processo
disciplinar.
Os juízes da corte europeia consideraram que a
obrigação é razoável e está de acordo com a Convenção Europeia de
Direitos Humanos. Eles explicaram que, embora a convenção proteja o
sigilo das comunicações especialmente entre advogado e cliente, essa
proteção não é absolutamente inviolável. Pode ser afastada por lei,
desde que haja justificativa para isso.
O artigo 8º da convenção
estabelece: “Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada
e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência. Não pode haver
ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando
esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência
que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança
nacional, para a segurança pública, para o bem-estar econômico do país, a
defesa da ordem e a prevenção das infrações penais, a proteção da saúde
ou da moral, ou a proteção dos direitos e das liberdades de terceiros”.
De
acordo com a regulamentação, o advogado só deve delatar seu cliente
quando estiver prestando auxílio profissional em operações financeiras
fora dos tribunais. Para a corte europeia, a norma francesa não abala a
confiança do cliente no seu advogado quando se trata de processo
judicial já que, quando o defensor representa seu cliente na Justiça,
fica livre da obrigação.
Os juízes europeus também consideraram
que a norma impõe ao advogado o dever de comunicar suas suspeitas
diretamente ao presidente da seccional da Ordem dos Advogados onde é
associado. Para a corte, a comunicação das suspeitas ao também colega de
profissão e, portanto, submetido às mesmas regras de conduta, não viola
nenhuma prerrogativa profissional. Cabe então ao presidente da
seccional o papel de avaliar as informações recebidas e decidir se é o
caso de comunicar às autoridades policiais sobre as suspeitas de crime
financeiro.
União Europeia
A norma que obriga os advogados a delatar seus clientes foi aprovada pela Ordem dos Advogados da França em 2007, como regulamentação da Diretiva da União Europeia sobre lavagem de dinheiro. A diretiva visa o combate ao crime financeiro e ao financiamento de atividades terroristas. Impõe especialmente aos bancos nos países da UE a obrigação de comunicar à Polícia suspeitas de lavagem de dinheiro, mas também trata das responsabilidades de outros que, por conta da profissão, podem se deparar com o crime financeiro.
A norma que obriga os advogados a delatar seus clientes foi aprovada pela Ordem dos Advogados da França em 2007, como regulamentação da Diretiva da União Europeia sobre lavagem de dinheiro. A diretiva visa o combate ao crime financeiro e ao financiamento de atividades terroristas. Impõe especialmente aos bancos nos países da UE a obrigação de comunicar à Polícia suspeitas de lavagem de dinheiro, mas também trata das responsabilidades de outros que, por conta da profissão, podem se deparar com o crime financeiro.
Como regra, a diretiva exclui
os advogados da obrigação de participar do combate ao crime, mas prevê
exceções. “A consultoria jurídica continua a estar sujeita à obrigação
de segredo profissional, salvo se o consultor jurídico participar em
atividades de branqueamento de capitais ou de financiamento do
terrorismo, se prestar consulta jurídica para efeitos de branqueamento
de capitais ou de financiamento do terrorismo ou se o advogado estiver
ciente de que o cliente solicita os seus serviços para esses efeitos”,
estabelece a norma (Clique aqui para ler).
Foi
o advogado Patrick Michaud, membro da seccional de Paris da Ordem dos
Advogados francesa, que levou à reclamação à Corte Europeia de Direitos
Humanos. Antes, ele tentou que a própria Ordem suspendesse a
regulamentação. Sem sucesso, resolveu levar à discussão para o tribunal
europeu.
Michaud alega que a obrigação imposta aos advogados viola
a confidencialidade garantida na comunicação com seus clientes. Ele
também defende que a obrigação de delatar com base apenas em suspeitas
afronta o direito à presunção de inocência e o de não se
auto-incriminar. Já que, com essa obrigação em vigor, quem é acusado de
lavagem de dinheiro estaria praticamente confessando o crime ao procurar
um advogado.
No Brasil, a obrigação de os advogados delatarem
seus clientes também está sendo discutida. Em julho deste ano, foi
aprovada a Lei 12.683/2012, nova lei de lavagem de dinheiro. A norma
estabelece que pessoas físicas ou jurídicas que tenham conhecimento do
crime financeiro em razão da sua profissão relatem as suspeitas aos
órgãos competentes. A lei não trata especificamente dos advogados, mas
pode ser interpretada também no sentido de obrigar os defensores a
delatar clientes.
Por conta disso, em outubro, a Ordem dos
Advogados do Brasil pediu ao Supremo Tribunal Federal que exclua
expressamente a advocacia da incidência da lei. Em Ação Direta de
Inconstitucionalidade, a OAB alega que a norma não se aplica aos
advogados em razão dos princípios constitucionais de proteção ao sigilo
profissional.
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