O bem de família voluntário apresenta vantagens em relação ao bem de família legal? Por Adriano Ferriani
O instituto do bem de família foi inspirado em uma lei texana (Homestead Exemption Act),
de 1839, antes de o Texas se tornar um estado norte-americano. O
momento era de crise e o motivo de sua criação foi a aflição e o
sentimento de injustiça de ver famílias inteiras se arruinando por
dívidas que não podiam ser adimplidas.
Embora não constasse do
projeto original de Clóvis Beviláqua, o bem de família voluntário
nasceu entre nós com o Código Civil de 1916. Foi de pouca aplicação
prática porque, embora determinasse a impenhorabilidade do imóvel
residencial da família, dependia de instituição por meio de escritura
pública e engessava o proprietário, pois outro de seus efeitos era a
inalienabilidade do prédio utilizado para moradia.
Em 1990, surgiu a lei
8.009, criando o bem de família legal. O seu objetivo foi o de
determinar a impenhorabilidade do imóvel residencial, independentemente
da instituição do bem de família. Com isso, estendeu-se o benefício a
todos que não queriam se valer do instituto contido no Código Civil, sem
alguns de seus inconvenientes. O bem de família legal não tem custo
algum, não depende de escritura, de registro, e também não torna o
imóvel inalienável. Basta morar no imóvel e alegar a impenhorabilidade
(o requisito "morar no imóvel" foi recentemente mitigado pelo STJ,
conforme súmula 486, e será objeto de outra Civilizalhas).
E a impenhorabilidade
pode ser oposta em qualquer processo de execução civil, fiscal,
previdenciária, trabalhista ou mesmo de outra natureza, salvo se movido
(art. 3º da lei 8009/90): a) em razão dos créditos de trabalhadores da
própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias (ex:
empregada doméstica, motorista, etc.); b) pelo titular do crédito
decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do
imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do
respectivo contrato; c) pelo credor de pensão alimentícia; d) para
cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições
devidas em função do imóvel familiar; e) para execução de hipoteca sobre
o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou entidade familiar;
f) por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de
sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento
de bens; g) por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de
locação.
Depois, em 2002, com o
Código Civil vigente, surgiu o bem de família voluntário remodelado,
ab-rogando o anterior, porém, sem revogar o bem de família legal. O
assunto está disciplinado nos artigos 1711 a 1720 do Código Civil.
Uma das importantes
novidades foi a possibilidade de o instituidor destinar à proteção, além
do imóvel residencial, também valores mobiliários a ele atrelados,
desde que não ultrapassem o seu valor ao tempo da instituição (artigos
1712 e 1713 do CC) e que sejam destinados ao sustento da família ou
manutenção do imóvel.
Outra novidade é a permissibilidade de instituição por terceiros, seja por meio de doação ou de testamento.
Evidente que tais mecanismos não podem ser utilizados com o propósito de frustrar credores.
Não há limite legal
absoluto para a instituição do bem de família, mas sim relativo. O
imóvel e valores mobiliários que o compõem não podem ultrapassar um
terço do patrimônio líquido do instituidor, ao tempo da instituição.
Referido requisito faz com que o bem de família voluntário seja
aplicável somente aos ricos porque o pobre, quando tem casa própria, não
costuma ter outros bens com valor suficiente para cumprir tal exigência
legal.
Essa é uma das críticas
atribuíveis ao instituto remodelado. Apesar disso, há peculiaridades
que o tornam mais interessantes que o bem de família da lei 8.009/90.
Parece-nos que as
vantagens mais significativas do bem de família voluntário, se comparado
com o legal, são a possibilidade de incidir também sobre valores
mobiliários, permitindo a blindagem de um patrimônio que não se limite
apenas a bem imóvel e, principalmente, quanto à extensão da proteção.
Enquanto o bem de
família legal permite que uma série de credores efetive a penhora,
amparados pelas diversas exceções contidas no art. 3º. da lei 8.009/90, o
bem de família voluntário admite a constrição judicial apenas para a
quitação de dívidas anteriores à sua constituição, dívidas de tributos
relacionados ao próprio imóvel e débitos condominiais. Por isso, a
proteção acaba sendo significativamente maior com o bem de família
voluntário.
Por outro lado, continua apresentando o inconveniente da inalienabilidade.
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