Inversão do ônus da prova faz Justiça do Maranhão anular sentenças contra a Telemar

A 4ª câmara Cível do TJ/MA anulou duas sentenças que condenavam a Telemar Norte Leste S/A a ressarcir consumidores que alegavam falhas no serviço prestado pela empresa e cobrança indevida em boletos de pagamento. O TJ maranhense reconheceu a nulidade das sentenças que inverteram o ônus da prova em desfavor da Telemar. 
1º Caso
A apelação Cível 22826-28.2004.8.10.0001 foi interposta contra a sentença do juízo da 5ª vara Cível da Capital, que declarou indevidas as cobranças efetuadas na fatura de telefone do apelado, por considerar que os respectivos serviços de telefonia não foram usufruídos por ele, e condenou a Telemar ao pagamento de indenização no valor de R$ 10 mil por danos morais.

No recurso, a Telemar alegou a nulidade da decisão diante do cerceamento do seu direito de defesa, uma vez que o juízo inverteu o ônus da prova apenas no momento da sentença. O desembargador Paulo Sérgio Velten Pereira, da 4ª câmara Cível do TJ/MA, ressaltou ser "curial que a inversão do ônus da prova ocorra antes da iniciada a coleta da prova, sem surpresa para as partes, pois a inversão altera o sistema de distribuição ordinária do ônus probandi". E confirmou que no caso a inversão foi extemporânea "porque ocorreu apenas quando da prolação da sentença pelo juízo de base, surpreendendo a apelante e ofendendo a garantia constitucinal de tratamento igualitário às partes e da ampla defesa". Por maioria dos votos, a 4ª câmara Cível deu provimento ao recurso da Telemar.
2º Caso
A Telemar interpôs a apelação 0037574-89.2009.8.10.0001 contra sentença do juízo da 8ª vara Cível da Comarca de São Luís/MA, que julgou parcialmente procedente uma ação indenizatória que a condenou a restabelecer a prestação de serviços de telefonia fixa, a suspender cobranças e ameaças de incluir o nome dos autores em cadastros negativos de crédito, bem como a pagar o valor de R$ 5 mil por danos morais. A alegação neste caso também foi de cerceamento de defesa, pugnando pela improcedência da ação ou a diminuição do quantum indenizatório .
A desembargadora Anildes de Jesus Bernardes Chavez Cruz assinalou em seu voto que ficou "evidente o cerceamento da defesa ante a transferência do ônus da prova somente na sentença."
Por unanimidade, os desembargadores da 4ª câmara Cível do TJ/MA, deram provimento ao recurso da Telemar, seguindo o voto da relatora. A sentença foi anulada e os autos devolvidos ao juízo de origem, "a fim de que se dê oportunidade às partes a dilação probatória".
O advogado Ulisses César Martins de Sousa, do escritório Ulisses Sousa Advogados Associados, representou a empresa nas causas.
  • Processos : 22826-28.2004.8.10.0001
    0037574-89.2009.8.10.0001
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ESTADO DO MARANHÃO
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
QUARTA CÂMARA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL nº 22826-28.2004.8.10.0001 (28.041/2010 – São Luís)
Relator : Desembargador Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA
Revisor : Desembargador JAIME Ferreira de ARAÚJO
Apelante : Telemar Norte Leste S/A
Advogados : Dr. Ulisses César Martins de Sousa e outros
Apelado : Carlos Clark Lago Rosa
Defensor Público : Dr. Dario André Cutrim Castro
Acórdão nº 100.905/2011
EMENTA – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE PROCEDIMENTO. SENTENÇA. MOMENTO INOPORTUNO.
1. A inversão do ônus da prova consubstancia verdadeira regra de procedimento e o momento apropriado para tal é a fase instrutória, na medida em que não impõe qualquer surpresa às partes litigantes, inadmitindo-se a aplicação da regra só quando da prolação da sentença. 2. Recurso conhecido e provido.
Maioria.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Senhores Desembargadores da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por maioria de votos, em conhecer, de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, e dar provimento ao Recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator.
Participaram do julgamento, além do Relator, os Senhores Desembargadores JAIME Ferreira de ARAÚJO e ANILDES de Jesus Bernardes Chaves CRUZ. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. José Henrique Marques Moreira.
São Luís (MA), 1º de fevereiro de 2011
Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA
Relator
RELATÓRIO
Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA (relator):
Trata-se de Apelação (ApCív) interposta contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Capital, que declarou indevidas as cobranças efetuadas na fatura de telefone do Apelado, por considerar que os respectivos serviços de telefonia não foram usufruídos por ele, e condenou a Apelante ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil (fls. 190/194).
Em suas razões, a Apelante arguiu a nulidade do decisum diante do cerceamento do seu direito de defesa, já que o Juízo de base, sem qualquer fundamentação, resolveu inverter o ônus da prova apenas no momento da sentença.
Argumenta, ainda, que não houve defeito na prestação do serviço e que as cobranças realizadas decorreram do exercício regular de direito. Por fim, insurge-se contra o pagamento de indenização por danos morais, suscitando culpa exclusiva do Apelado, pelo que requer a reforma da sentença (fls. 198/231).
Nas contrarrazões, o Apelado sustenta que, tratando-se de ação que tem por objeto relação de consumo, a Apelante já tem prévia ciência de que o ônus da prova será invertido, razão pela qual não pode alegar surpresa nem cerceamento do direito de defesa. Quanto ao dever de indenizar, afirma que os serviços prestados pela Apelante foram precários, o que possibilitou a indevida utilização do terminal telefônico por terceiros. Por fim, requer seja negado provimento ao Recurso (fls. 238/247).
A PGJ manifestou-se apenas pelo conhecimento do Recurso (fl. 255).
É o relatório.
VOTO
Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA (relator): Preenchidos os requisitos intrínsecos de admissibilidade, concernentes ao cabimento, legitimidade e interesse recursal, assim como os pressupostos extrínsecos relativos à tempestividade, regularidade formal e preparo, conheço do Recurso. A inversão do ônus da prova consubstancia verdadeira regra de procedimento (e não de julgamento), cuja finalidade é possibilitar que as partes saibam se conduzir no processo. Assim, uma vez presentes os requisitos do art. 6º VIII do CDC, é curial que a inversão do ônus da prova ocorra antes de iniciada a coleta da prova, sem surpresa para as partes, pois a inversão altera o sistema de distribuição ordinária do ônus probandi.
Com efeito, “por consistir numa regra de procedimento com força capaz de alterar a distribuição usual da carga probatória, em respeito ao princípio maior da ampla defesa, imprescindível que sua aplicação seja previamente anunciada, inclusive dando ciência ao demandado do ponto controvertido sobre o qual o ônus
A valer, “dúvida não há quanto ao cabimento da inversão do ônus da prova ainda na fase instrutória – momento, aliás, logicamente mais adequado do que na sentença, na medida em que não impõe qualquer surpresa às partes litigantes” (STJ, REsp 662.608/SP, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa). Precedentes do STJ (REsp 881.651/BA, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa e REsp 598.620/MG, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).
No caso, a inversão foi extemporânea porque ocorreu apenas quando da prolação da sentença pelo Juízo de base (fl. 190-verso), surpreendendo a Apelante e ofendendo a garantia constitucional de tratamento igualitário às partes e da ampla defesa (CF, art. 5º LV), sendo manifesto o erro de procedimento.
Ante o exposto, conheço, de acordo com o Parecer Ministerial, e dou provimento ao Recurso para anular o processo, incluindo a sentença (CPC, art. 248), a partir da audiência preliminar (fls. 145/146), que deverá ser realizada em todos os seus termos, oportunidade em que o Juízo poderá, inclusive, determinar a inversão do ônus da prova, assegurando à Apelante a oportunidade de, livre de surpresas, produzi-la durante a instrução.
É como voto.
Sala das Sessões da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado
do Maranhão, em 1º de fevereiro de 2011.
Desemb. Paulo Sérgio VELTEN PEREIRA
Relator

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