Para entender a usucapião extrajudicial, por Rosângela Maria de Azevedo Gomes

Código de Processo Civil que entrou em vigor em março deste ano prestigiou as formas de solução mais adequadas dos conflitos de interesse. Dessa forma, além de técnicas já conhecidas e praticadas como a mediação e a arbitragem, surgiu no art. 1071 a usucapião extrajudicial.
Tal instrumento de regularização fundiária pretende tornar mais célere a aquisição da propriedade, por meio da posse mansa (sem oposição), qualificada(de boa-fé e com função social) e cujo tempo será o requerido conforme a modalidade de usucapião que se deseja arguir. Tais são os pressupostos. A partir da existência deles pode-se iniciar o procedimento comprovando os requisitos.
O texto da lei processual demanda uma regulamentação para sua aplicação imediata. Tal procedimento tem sido feito por cada Estado, na medida das suas demandas e possibilidades. Os Estados do Rio de Janeiro e São Paulo já possuem regras que permitem a aplicação de tal procedimento, embora o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) esteja formando um procedimento nacional.
Certo é que alguns pontos já estão definidos e não serão alterados. A saber:
1- Documentos que qualifique o possuidor e, se for o caso, seu cônjuge ou companheiro (certidão de casamento ou contrato/declaração de união estável, identidade e CPF, comprovação do domicílio cujo endereço será o do bem arguído);
2- Comprovação da posse. Servindo para tanto os impostos e taxas pagos, preferencialmente em nome do possuidor;
3- A anuência do titular da propriedade, pois, conforme o texto da lei processual, o silêncio representa a negativa, gerando a impossibilidade da usucapião extrajudicial. Porém, a via judicial ainda poderá ser utilizada.
Para a comprovação desse requisito pode ser apresentada a escritura de promessa de compra e venda, a cessão de direitos (inclusive hereditários, desde que assinados por todos os herdeiros e seus cônjuges/companheiros) ou outro documento hábil à transmissão da propriedade;
4- A declaração dos confinantes (vizinhos) informando que conhecem o requerente e declaram o conhecimento da existência da posse sem contestação. Tal documento pode ser via instrumento particular, mas com as assinaturas reconhecidas em cartório;
5- A declaração de titulares de direitos reais (credores hipotecários, usufrutiários, titulares de direito de superfície, titulares de direito real de uso/moradia, etc), informado que não se opõem à usucapião. Esta declaração também poderá ser feita por instrumento particular com as firmas reconhecidas;
6- Plantas do imóvel com o memorial descritivo elaborado e assinado por engenheiro ou arquiteto, certificado pela municipalidade. No caso de unidade edilícia será necessária a planta da incorporação e a da unidade com os respectivos memoriais descritivos.
Observe-se que o posterior registro no Registro de Imóveis será lavrado em conformidade com a descrição do memorial. Portanto, será muito importante que o documento seja fiel à realidade do imóvel;
7- Ata notarial ( Registro de Notas) lavrada com a comprovação dos documentos mencionados, indicação da modalidade de usucapião que será adotada, os documentos que comprovem os seus requisitos e assinada pelo possuidor e testemunhas.
Observe-se que qualquer modalidade de usucapião é passível de ser arguida pela via extrajudicial. Apenas deve-se ter o cuidado de optar pela modalidade que pode ser comprovada;
8- Serão necessárias, também, certidões que comprovem a ausência de oposição. O Cartório de Notas que lavrará a ata poderá providenciar as certidões, a pedido e com ônus do possuidor/requerente. Tal medida é mais adequada e acelera o procedimento;
9- Procuração nomeando advogado para representar o possuidor e seu cônjuge/companheiro no processo administrativo.
Importante assinalar que o processo administrativo nasce no Cartório de Notas, jamais no Registro de Imóveis, salvo nas comarcas de registro único. O Registro de Imóveis somente receberá o processo após o pronunciamento da União, Estado e Município indicando que não existe oposição à usucapião, que o imóvel está livre e desimpedido e não existem limitações à aquisição.
No caso da União o pronunciamento será do órgão encarregado do Patrimônio da União (SPU), nos Estados e Municípios as respectivas Procuradorias serão citadas para o pronunciamento. Observe-se que a lei estabeleceu o prazo de 15 dias para tanto, sob pena do silêncio representar a ausência de interesse.
Remarque que o advogado deve ser diligente para que o possuidor, uma vez titulado na propriedade, não seja surpreendido com uma demanda judicial de um dos entes federativos indicando interesse e que não havia se pronunciado diante do prazo exíguo de 15 dias. Logo, recomenda-se que o pronunciamento dos órgãos competentes demostrando a ausência de interesse e obstáculos à aquisição esteja nos autos do processo, que será encaminhado ao Registro de Imóveis para a aquisição da propriedade originária, via usucapião. Pois, tudo o que se deseja é evitar uma demanda judicial, diante da morosidade do Poder Judiciário que se encontra sobrecarregado.

Por fim, para que se tenha a dimensão da importância do novo procedimento, não haverá o recolhimento do imposto de transmissão, visto ser a aquisição originária.

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