Na esteira dos leilões
dos aeroportos seguiu-se um debate em torno de se saber se concessão é
ou não o mesmo que privatização. Descontadas as conveniências políticas e
relevadas as dificuldades advindas das amarras ideológicas, é preciso
ter clareza de cada conceito. Isso porque, enquanto concessão é um
instrumento jurídico com conteúdo jurídico bem definido, o termo
privatização é bem mais amplo, dúctil e variado de sentidos.
Privatização pode ser ou não ser sinônimo de concessão. Concessão é a
delegação ao particular da exploração de uma dada atividade ou bem
(genericamente uma utilidade) de titularidade do poder público, por
prazo determinado. O poder público, porém, segue titular (dono) deste
bem ou atividade. Ao final do prazo, retorna a utilidade, podendo
operá-la diretamente ou delegar novamente sua operação.
Portanto, se entendemos
privatização como a retirada em definitivo do Estado de um dado setor ou
atividade, então, privatização não se confunde com concessão. Se,
porém, tomarmos privatização como o conjunto de mecanismos pelos quais o
Estado convoca os privados para atuar em setores de responsabilidade do
poder público, então, tratam-se concessão e privatização de sinônimos.
As concessões de rodovias nos
anos 90 e, mais recentemente, no Governo Lula, foram privatização neste
segundo sentido. Da mesma forma como foram os leilões dos aeroportos e
do setor elétrico nos anos recentes.
Houve privatização sem que
houvesse concessões. A alienação do controle dos bancos públicos foi
privatização sem concessão, pois os bancos alienados não retornarão à
União ou aos Estados e o setor financeiro não é reservado ao poder
público, embora seja inteiramente regulado pelo Banco Central. O mesmo
podemos dizer no caso da Vale e da Embraer. Ali privatizou-se no sentido
de transferir em definitivo ao privado. O ganho público se deu pela
eficiência do privado, que desenvolveu a economia e arrecadou quantias
astronômicas em impostos.
Pode haver, de outro lado,
concessão casada com venda de ativos (privatização no sentido de
alienação). Foi o que ocorreu no setor de telecomunicações.
Lá tivemos concessões
(transferência da exploração da telefonia fixa para empresas que se
tornaram privadas, com prazo até 2025) combinadas com alienações (como
ocorreu com as empresas estatais de telefonia móvel, por exemplo). Neste
caso houve a retirada da União de segmentos das telecomunicações e,
portanto, não se utilizou de concessões. Tais atividades são e seguirão
sendo reguladas pela União, por meio da Anatel, mas a única atividade
que segue sendo reservada ao poder público (mesmo assim sem
exclusividade) é a telefonia fixa comutada. Justamente por isso, quando
houve o leilão da privatização (no sentido de alienação) das empresas do
Sistema Telebrás, todos os bens que não eram imprescindíveis à
prestação da telefonia fixa, foram vendidos e não retornarão mais, nunca
mais, para o patrimônio da União. Passaram, com o leilão, a ser
patrimônio privado. Os terrenos, imóveis e veículos foram privatizados
e, portanto, não pertencem mais à União. O que voltará para o poder
público ao fim das concessões de telefonia fixa é, exclusivamente, o
conjunto de equipamentos ou direitos necessários à continuidade da
prestação daquele serviço. A sede administrativa, os imóveis ociosos, o
automóvel da diretoria nunca mais serão públicos.
Porém, a adequada separação
conceitual entre os dois instrumentos, embora necessária para aclarar o
debate, acaba por mascarar um ponto relevante. Concessão ou privatização
são ambos instrumentos importantes à disposição do Estado para, em
setores específicos, contar com a participação do setor privado na
consecução de finalidades públicas. Afinal, a única razão para o poder
público ser titular de bens e de atividades a oferecer ao cidadão mais e
melhores utilidades. Seja por meio de sua estrutura própria, seja com o
concurso ou colaboração da iniciativa privada. Ao cidadão importa o que
lhe é oferecido e não quem oferece ou em que regime jurídico tais
utilidades lhe são oferecidas.
Comentários
Postar um comentário